Sustentabilidade do dia a dia:
palito de fósforos
* Ecio Rodrigues
No cotidiano dos indivíduos, inúmeras decisões de consumo são tomadas sem
levar em conta certos requisitos relacionados à sustentabilidade. Ainda que, de
maneira geral, as pessoas sejam sensíveis aos impactos ambientais decorrentes
do modelo de desenvolvimento assumido pela humanidade, essa sensibilidade dificilmente
se reflete nas pequenas decisões tomadas diuturnamente.
O que acontece é que, diante da generalidade do conceito de Desenvolvimento
Sustentável – cunhado e negociado durante a conferência da Organização das
Nações Unidas que ficou conhecida como “Rio 92” –, fica difícil para as pessoas
interpretá-lo, ou melhor, traduzi-lo para a sua realidade diária.
Preocupados, certamente todos estão, mas são poucos os que possuem
informações suficientes para converter essa preocupação em critérios, a ponto
de influenciar uma decisão comezinha, como a compra de determinado utensílio doméstico.
A bem da verdade, o movimento ambientalista deveria se voltar mais para
incorporar a sustentabilidade no dia a dia das pessoas.
A sustentabilidade está relacionada à matéria-prima e ao processo
produtivo aproveitados na fabricação dos bens de consumo. Dessa forma, pode se
dizer que os critérios que informam a condição de sustentabilidade dizem
respeito à origem da matéria-prima e ao tipo de tecnologia que é empregada na
manufatura ou cultivo de um produto.
Evidentemente, não basta se imputar a rotulagem de “verde”, “ecológico”
ou “sustentável” para resolver-se o problema do impacto ambiental embutido em
determinado processo produtivo.
Não é porque se confere, por exemplo, a designação de “boi verde” a um
rebanho bovino (em função de alguma condição aleatória), que a respectiva
criação de gado, uma atividade que se caracteriza pela conversão da floresta em
pastagem, pode ser considerada sustentável. Para a realidade amazônica, aliás,
é impossível arrogar-se à pecuária qualquer atributo de sustentabilidade.
Sendo assim, sob o ponto de vista da sustentabilidade, a decisão, em tese
singela, entre comprar palitos de fósforos ou isqueiros embute a análise de uma
série de elementos relacionados à matéria-prima e ao processo produtivo desses
artigos, de forma que a escolha recaia sobre o apetrecho mais adequado aos ideais
do desenvolvimento sustentável.
No caso, a decisão acertada para a sustentabilidade é o palito de
fósforos, porque para a fabricação desse produto utiliza-se a madeira, uma
matéria-prima que é renovável, ou seja, que pode ser cultivada. A Populus nigra (ou
“álamo”, como é comumente conhecida), espécie empregada na produção de palitos de fósforos, pode ser plantada aos milhares para atender a
toda a demanda por acendedores que há no mundo.
Já o isqueiro pode ser considerado o típico
exemplo de um produto que deveria ser (e certamente será) banido do sistema
econômico. Quase toda a matéria-prima empregada na fabricação do isqueiro não é
renovável e, o mais grave, é intensiva no elemento químico carbono, principal
causador do efeito estufa e do conseqüente aquecimento global.
Desde a cápsula que armazena o gás, que é
fabricada em plástico ou outro derivado de petróleo, passando pelo próprio gás,
e chegando até a pedra que faz a faísca e a válvula que regula a chama – esses artefatos
são derivados de jazidas, matérias- -primas
não renováveis, que um dia irão se extinguir. Ademais, ao ser descartado, o
palito de fósforo se degrada no meio ambiente, o que não acontece com o
isqueiro.
Usar palitos de fósforos como acendedor: essa singela
decisão de consumo ajuda o mundo a ser mais sustentável.
* Professor da
Universidade Federal do Acre (Ufac), Engenheiro Florestal, Especialista em Manejo Florestal
e Mestre em Economia e Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná
(UFPR) e Doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de
Brasília (UnB).
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