terça-feira, 26 de abril de 2016

Será o fim do inverno amazônico?
* Ecio Rodrigues
Pesquisadores que atuam com climatologia e meteorologia na Amazônia vêm alertando, com mais veemência nos últimos 10 anos, para um fenômeno climático que pode alterar – de forma radical, advirta-se – o cotidiano de quem vive na região: o fim da estacionalidade.
Por estacionalidade entenda-se a divisão do ano em períodos distintos, caracterizados por condições específicas de clima, que vão provocar reações igualmente específicas por parte das plantas e dos animais.
Não é segredo para ninguém que a primavera é a estação das flores; significa que, no ano corrente de 2016, no caso do Brasil, país situado abaixo da linha do equador, a maior parte das plantas deverá florir entre 22 de setembro e 21 de dezembro.
A primavera é a estação que começa após o inverno e cujo término dá início ao verão. O outono, por outro lado, marca o interstício entre o verão e o inverno.
Nas zonas temperadas, onde as estações climáticas são bem definidas, como acontece no Sul do Brasil, o cotidiano é moldado a partir dos impactos causados pelo calor, pelo frio, pela floração das árvores, pela queda das folhas – só para fazer referência a alguma característica marcante de cada estação.
Na Amazônia, todavia, isso não acontece. Como dizem os mais experientes, na Amazônia só há duas estações, a seca e a chuva.
No tempo da completa ausência de infraestrutura, quando a pavimentação de ruas era um luxo desfrutado apenas em metrópoles como Manaus e Belém, dizia-se que essas duas estações eram a da lama e a da poeira.
Mas, a presença de lama e de atoleiros representa apenas uma das faces da “estação das chuvas” – a outra se refere ao aumento da vazão dos rios, que, por sua vez, leva à fartura das cheias, além de importar em melhoria expressiva na beleza cênica da paisagem.
As chuvas também sempre foram associadas à ocorrência de temperaturas mais amenas – por isso, o período das chuvas corresponde ao chamado inverno amazônico.
Seguindo à risca as efemérides das estações do ano, diga-se que em 21 de março último teve início o outono, assinalando-se o fim do verão. Na Amazônia, contudo, esse período costumava marcar o fim do “inverno”, ou seja, a ocasião em que começavam a rarear as chuvas e iniciava-se o “verão”, a época da seca, cujo auge acontecia ente agosto e setembro.
Mas já não é bem assim. Para os cientistas que monitoram as curvas de pluviosidade e a temperatura (para ficar nas principais variáveis), o fim da estacionalidade pode ser uma realidade. Significa afirmar que a distribuição anual das chuvas pode deixar de apresentar as variações que justificavam tanto o inverno quanto o verão amazônicos.
A se confirmar essa hipótese, o que certamente requer a continuidade das pesquisas envolvendo clima, meteorologia e interação entre água e mata ciliar, a vida na região terá que se adequar a alterações que dizem respeito a temperatura, disponibilidade de água, quantidade e intensidade de luz. Tudo agravado por ambiente e clima rigorosos, que não se compadecem dos que moram por aqui.
Será o fim do inverno amazônico? Pode ser. Mas a adaptação às novas condições do clima não será fácil.


*Professor Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro florestal, especialista em Manejo Florestal e mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná, e doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.

Livro Ciliar Só Rio Acre

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