segunda-feira, 23 de abril de 2018



Coletânea “Da Floresta: 100 artigos” chega às livrarias
* Ecio Rodrigues
Com o sugestivo título “Da Floresta: 100 artigos”, os autores Ecio Rodrigues e Aurisa Paiva reuniram em livro uma compilação dos artigos aqui publicados, por eles, no período entre 2013 e 2017.
É a última de uma série de 3 coletâneas. A primeira, “Do Acre: 100 artigos”, foi publicada em 2009; a segunda, “Da Amazônia: 100 artigos”, em 2014.
Motivados pelas causas que defendem há mais de 20 anos, os articulistas optaram por organizar o livro no que denominaram “Campanhas de Sensibilização”.
São 10 campanhas, cada uma compreendendo uma quantidade variável de artigos – que, por sua vez, guardam coerência entre si, ainda que não sejam complementares.
Sem a pretensão de persuadir ou doutrinar, os textos abordam, sob um ponto de vista muitas vezes dissonante do senso comum, problemas que rondam o cotidiano de quem vive na Amazônia.
Não à toa, todas as 10 bandeiras defendidas na coletânea trazem como pano de fundo uma interface direta com a realidade e os destinos da região – e com as implicações dessa realidade no país e no planeta.
Trata-se de problemas que, embora recorrentes, são amiúde esquecidos pela imprensa – sempre sensacionalista e despreparada –, e recusados pela classe política, eternamente movida pelo temor de perder votos.
A temática é velha conhecida dos leitores que acompanham os artigos semanais. Desmatamento, queimadas, mata ciliar, fauna amazônica, unidades de conservação, cluster florestal...
Temática que pode ser sintetizada numa única palavra: sustentabilidade.
Como diversas vezes já se defendeu nesse espaço, a sustentabilidade da Amazônia não é opcional, ela deve ser obstinadamente buscada, e os amazônidas não podemos fugir de nossa responsabilidade perante o mundo.
Já não há mais tempo para tergiversações. Por um lado, o aquecimento do planeta é uma verdade científica, e o desmatamento e as queimadas que ocorrem na Amazônia contribuem com cerca 1/3 do carbono concentrado na atmosfera.
Por outro lado, o uso econômico das áreas desmatadas encontra limites técnicos agronômicos insuperáveis – quer dizer, não há futuro para a ocupação produtiva baseada no desmatamento.
O único caminho, defendido pelos cientistas e pela imensa maioria da capacidade técnica instalada na região, está ancorado na exploração econômica da diversidade biológica e, no curto prazo, na oferta de água e no sequestro de carbono.
Inclusive, no que se refere à prestação de serviços florestais relacionados aos recursos hídricos e ao aquecimento do planeta, os países demonstraram concordar com a precificação desses serviços quando subscreveram o Acordo de Paris.    
Contribuir para o debate em torno dessas questões é o propósito do livro.
Uma coisa é certa. O livro “Da Floresta: 100 artigos”, sob uma perspectiva que foge do lugar-comum e da excentricidade que costumam prevalecer quando o assunto é a Amazônia, discute saídas para a estagnação econômica e crise ecológica que assola a região.
Só por isso vale a leitura.
À venda em Rio Branco na Livraria Paim, por módicos 25,00 reais.

*Professor Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro florestal, especialista em Manejo Florestal e mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná, e doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.

segunda-feira, 16 de abril de 2018


As unidades de conservação da Amazônia e os parques de São Paulo

Ecio Rodrigues, 15/04/2018
Contaminada por problemas crônicos e insuperáveis, a gestão das unidades de conservação na Amazônia é um caos.
Essa foi, em suma, a conclusão a que chegou uma auditoria operacional realizada pelo Tribunal de Contas da União, TCU, em 2013, sobre o funcionamento dessas áreas naturais protegidas, que ocupam mais de 20% do território amazônico.
Ocorre que 96% das unidades de conservação, segundo o TCU, apresentam deficiências graves de gestão, e sequer podem ser consideradas como implantadas – ainda que, em média, somem mais de 10 anos de criação.
A despeito da qualidade técnica do trabalho e da reconhecida autoridade do TCU, o ICMBio, órgão responsável pela administração das UCs, ao que parece, não deu a mínima para as conclusões da auditoria.
Escondendo-se sob argumentos antigos e recorrentes (falta de servidores, de veículos, de dinheiro…), o ICMBio escamoteia o ponto central do problema: a eterna e absoluta incapacidade estatal (primeiro, Sema; depois, Ibama; agora, ICMBio) para administrar com algum resultado as unidades de conservação.
Não se questiona a capacidade técnica dos servidores (que são mais que qualificados), longe disso. O ponto é que, no Brasil, nunca – nunca! – um órgão público irá se pautar por valores relacionados a eficiência, eficácia e efetividade, sobretudo em se tratando de um patrimônio territorial gigantesco, que traz sérias dificuldades de logística.
Os princípios que importam à administração pública são outros – como transparência e lisura.
Sem embargo desse DNA tão característico à gestão público-estatal, é fato que existe grande resistência às privatizações. E embora alimentada por paupérrima retórica, essa resistência costuma receber o apoio da mídia.
Mas, novos ventos sopram no horizonte. Com inusitada ousadia, a Prefeitura de São Paulo divulgou edital conclamando empresas a incluir a gestão de espaços públicos em seu portfólio de negócios.
Denominado de “Procedimento de Manifestação de Interesse”, o edital lista um conjunto de 14 parques municipais, entre os quais se incluem Anhanguera, Independência, Buenos Aires, Carmo, Chácara do Jockey, Cidade Toronto, Jardim da Luz, Trianon,  Vila Guilherme – e a joia da coroa: o Parque do Ibirapuera.
A ideia – simples, diga-se – é captar subsídios para estruturar um modelo definitivo de concessão, a fim de passar a pessoas jurídicas de direito privado (com ou sem fins lucrativos) a gestão, administração ou gerenciamento desses parques.
Ou seja, os espaços continuarão públicos, todavia geridos pela iniciativa privada. É uma saída para o nefasto e corriqueiro ciclo que se inicia com indicações políticas de administradores e termina com o abandono do parque.
O interessado deverá apresentar uma proposta descrevendo os projetos que pretende pôr em prática, o prazo da concessão, o valor a ser pago à prefeitura, e assim por diante.
Por seu turno, a administração municipal estabeleceu como cláusula inegociável que não poderá ser cobrado ingresso para o acesso do público.
Ainda, o concessionário deverá assumir todas as despesas de conservação com a estrutura existente e apresentar plano de investimento voltado para a melhoria contínua dos serviços prestados.
Na pior das hipóteses, a iniciativa paulista servirá como experimento; na melhor (quem sabe?), poderá acordar o ICMBio.

quinta-feira, 5 de abril de 2018



Evolução da produção madeireira no Acre
* Ecio Rodrigues
Provavelmente, nenhum outro setor da economia no Acre passou pelas transformações ocorridas na indústria da madeira nos últimos 20 anos. Transformações relacionadas, sobretudo, à profissionalização, ao porte das empresas e à escala de produção de madeira.
A partir da intensificação do processo de ocupação produtiva levado a cabo na década de 1970, e que predominou até o final da década de 1990, o principal aspecto a caracterizar a indústria madeireira no Acre era a presença marcante das denominadas serrarias de ramal, simbolizadas na figura do “toreiro”.
As serrarias de ramal eram empreendimentos de pequeno ou médio porte, com capacidade reduzida de processamento primário de madeira.
Isso ocorria, basicamente, porque utilizavam equipamento defasado do ponto de vista tecnológico e trabalhadores com pouca qualificação; por outro lado, possuíam baixa disponibilidade de capital para realizar investimentos, sobretudo na exploração da madeira no interior da floresta.
Para complicar o quadro, as serrarias de ramal não priorizavam a madeira explorada com o emprego da tecnologia de manejo florestal (devido ao custo elevado), dando preferência à madeira oriunda de projetos de desmatamento voltados para a ampliação da pecuária bovina.
O desmatamento para a instalação de pastagens era legalizado mediante o licenciamento dos planos de exploração. Dessa forma, o madeireiro entrava na área para retirar o que considerava a melhor madeira, antes de o produtor realizar a queimada. Concentrada em algumas poucas espécies de maior valor comercial, a madeira dos pastos era obtida, à época, com abundância e a preços reduzidos.
Essa realidade, evidentemente, tinha prazo de validade. A madeira disponibilizada pelos planos de exploração iria escassear, à medida que fosse alcançado o limite legal de 20% (da área das propriedades rurais) passível de corte raso para pecuária.
A figura do toreiro é emblemática da fase das serrarias de ramal. Como a quantidade de toras colocadas no mercado em cada safra anual dependia, em muito, de sua atuação, o toreiro era um elo imprescindível na cadeia produtiva.  
Com a responsabilidade de fazer o contato entre o detentor da árvore (o produtor domiciliado num ramal ou mesmo numa reserva extrativista) e o comprador da tora (a serraria de ramal), o toreiro funcionava como responsável pelo processo de exploração e transporte das toras.
Motivado pela natural expectativa de um dia se tornar proprietário de uma serraria de ramal, o toreiro vivia às turras com a fiscalização – que, sabe-se lá por quais insanas razões, até hoje opta por inspecionar o transporte das toras, em vez de monitorar o processamento na indústria.
A expressão “toras transportadas na calada da noite”, cunhada naqueles tempos, não é de todo falsa e exemplifica a realidade da produção de madeira dessa época.     
Para efeito didático, se fosse possível fixar uma data para superação desse quadro, o ano de 2001 pode ser uma referência importante. Foi a partir desse momento que a política florestal estadual passou a viger, tendo conferido ênfase à produção de madeira manejada.
Vale dizer, madeira produzida de acordo com as técnicas de manejo florestal – que garantem que a extração seja sustentável, não causando risco à floresta – e, ademais, sob a orientação de um profissional qualificado, o engenheiro florestal.
Porém, tendo alcançado uma produção, em 2011, de 1.064.195 m2 de toras (sendo 90% madeira manejada), o setor chegaria ao limite.
Mas isso é outra história.
  

* Professor da Universidade Federal do Acre, Engenheiro Florestal, Especialista em Manejo Florestal e Mestre em Economia e Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná e Doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.

Livro Ciliar Só Rio Acre

Livro Ciliar Só Rio Acre