terça-feira, 19 de setembro de 2023

Especialistas do Banco Mundial afirmam que crédito para pecuária extensiva incentiva desmatamento na Amazônia

 * Ecio Rodrigues

Com o instigante título “Equilíbrio Delicado para a Amazônia Legal Brasileira: Um Memorando Econômico”, documento publicado pelo Banco Mundial, em 2023, sob a responsabilidade editorial do economista sênior Marek Hanusch, defende deslocar a outros setores o crédito público investido na pecuária extensiva na Amazônia.

Colocando ênfase na máxima de que o desenvolvimento da Amazônia depende do desmatamento zero, os economistas analisaram as estatísticas sobre os benefícios trazidos pelo crédito rural subsidiado (gerido pelo Basa e oriundos do FNO, Plano Safra e Pronaf) para a economia regional e o impacto na taxa anual de desmatamento.

A conclusão não poderia ser diferente do que tem sido reiterado em vários artigos publicados nesse espaço.

A fartura de capital anualmente emprestado ao pequeno e grande produtor a juros reduzidos amplia a competitividade da principal atividade responsável pela substituição da cobertura florestal, a pecuária extensiva.

Com clareza e objetividade incomum os economistas afirmam:   

Nos estados da Amazônia Legal com grande cobertura florestal remanescente, o principal programa de crédito rural, o Plano Safra, tende a apoiar a pecuária, a qual está fortemente associada ao desmatamento.

A suspensão do crédito para pecuária, que por um período de cinco anos poderia ser aplicado em atividades realizadas em área urbana com maior produtividade, traria uma redução drástica e rápida no desmatamento da Amazônia, mas essa alternativa sequer tem sido discutida por aqui.

E, na ausência de vontade política para o debate raramente aqueles que possuem simpatia pela saída econômica com o boi solto no pasto, se expõem em público pela, inevitável diga-se, defesa do desmatamento.

Diante do óbvio científico de que não se cria boi embaixo da floresta a discussão descamba para o contraditório apoio à pecuária extensiva e ao combate do desmatamento ilegal.

Insistindo na tosca ideia de que desmatamento legalizado difere do ilegal, como se o primeiro mantivesse as árvores e o segundo não, a caça aos produtores ilegais, aqueles que desmatam além do permitido pelo Código Florestal, consegue reunir imprensa, ambientalistas e, claro, os pecuaristas.

Todos no esforço de esquecer o impacto ecológico da pecuária extensiva, legalizada ou não, onde antes havia floresta.

Finalmente, o documento do Banco Mundial aponta alternativa para o desmatamento zero da Amazônia por meio do investimento em unidades de conservação florestal de maneira a superar o tempo de criar boi.

Nesse momento é importante esmiuçar as opções de política pública de desenvolvimento para Amazônia à exaustão: ou se desmata para ampliar a pecuária extensiva ou se produz riqueza com a biodiversidade florestal.

A boa notícia é que a maioria dos 198 países associados à ONU concordam que a saída econômica pela biodiversidade florestal da Amazônia prevalecerá!

*Engenheiro florestal (UFRuRJ), mestre em Política Florestal (UFPR) e doutor em Desenvolvimento Sustentável (UnB).

 

segunda-feira, 11 de setembro de 2023

Desmatamento zero e o crédito zero para pecuária extensiva na Amazônia

 * Ecio Rodrigues

Enquanto persistir oferta maior que a demanda de capital subsidiado para investir na pecuária extensiva será impossível alcançar o desmatamento zero, que inclui o desmatamento legalizado e o ilegal, na Amazônia.

Todos os anos os pecuaristas na Amazônia, que em 100% dos casos usam a tecnologia rudimentar da criação extensiva de gado, podem acessar parcela generosa de recursos financeiros por meio do crédito rural subsidiado, oriundo do FNO (Fundo Constitucional do Norte) e gerenciado em grande parte pelo Basa (Banco da Amazônia).

Por outro lado, desde a conferência conhecida por Rio 92, quando o desmatamento zero na Amazônia foi transformado em prioridade política mundial e, sobretudo após o Acordo de Paris, assinado em 2015, em que o governo brasileiro assumiu a meta de zerar o desmatamento até 2030, a oferta de crédito para pecuária extensiva se amplia.

Parece existir alguma contradição nisso.

Por exemplo, o Basa divulga relatórios anuais de sustentabilidade exaltando o aumento do crédito para a pecuária extensiva como se não tivesse qualquer relação com a ampliação do desmatamento, fazendo parecer possível o impropério científico de criar boi embaixo da floresta.

Por seu turno os gestores públicos, no governo federal e em todos os nove governos estaduais, incentivam, treinam e motivam o produtor para preparar o projeto de financiamento que vai permitir aumentar a quantidade de cabeças de gado na pecuária extensiva e receber o crédito do Basa, óbvio que com a condição de jurarem, sobretudo para os ingênuos jornalistas, jamais desmatar.

A nota de rodapé chave para selar o compromisso inusitado é que o aumento das cabeças de gado solto no pasto será possível graças à recuperação de áreas já degradadas pela própria pecuária extensiva que vai ser ampliada. Cruzes!

Claro que existe um componente eleitoral contraditório que faz com que o eleitor vote em quem defende o crédito para o produtor criar boi ao mesmo tempo em que também vota no candidato que é contra o desmatamento, como se não existisse vínculo científico entre um e outro. 

Concluindo, em um cenário de excesso de subsídio, não será por força do mercado ou pela graça divina que o investimento na substituição da terra coberta por floresta e localizada próxima das rodovias e nas margens dos rios por pasto deixará de aumentar.

Enquanto a defesa do agronegócio, no caso da Amazônia do agronegócio da criação extensiva de gado, se mostrar viável para os políticos ganharem votos e o retorno financeiro for atrativo para o produtor, o desmatamento zero jamais será alcançado em lugar algum quanto mais na Amazônia.

Alguns governos estaduais preferem defender às claras o pequeno e o grande produtor que investe na criação de gado onde antes havia uma floresta, outros fazem o mesmo de maneira camuflada, no final a pecuária extensiva é hegemônica e unanimidade na região.

E todos, sem entender que o mundo não vai aceitar a destruição da floresta na Amazônia, se esforçam para reduzir o tamanho da área de Reserva Legal e de outros tipos de florestas protegidas pelo Código Florestal.

Discutir o impacto do crédito público disponibilizado para pecuária extensiva na ampliação do desmatamento da Amazônia contribuiria de imediato para o desmatamento zero.

Crédito zero para criação de boi solto no pasto pode ser o ponto de inflexão que falta para o desmatamento zero na Amazônia!

 

*Engenheiro florestal (UFRuRJ), mestre em Política Florestal (UFPR) e doutor em Desenvolvimento Sustentável (UnB).

 

Livro Ciliar Só Rio Acre

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