segunda-feira, 31 de março de 2014


Hidrelétrica é o melhor caminho

* Ecio Rodrigues

Mesmo após a instalação de mais de 120 usinas em território nacional, nota-se uma indisposição generalizada da mídia, sempre despreparada, e da sociedade brasileira em geral para com as hidrelétricas.
Difícil compreender as razões dessa indisposição, mas, ao que tudo indica, associa-se o aproveitamento das águas a prejuízo econômico, impactos sociais negativos e, o maior dos equívocos, elevada degradação ecológica. Tudo errado.
Comecemos pela viabilidade econômica. Não existe dúvida quanto ao fato de que, atualmente, a força das águas se configura a opção mais barata para a geração de energia elétrica no país. Em face da longa vida útil do empreendimento, os custos referentes à construção de uma hidrelétrica, por maiores que sejam (e quanto maior a rejeição da sociedade, mais elevados eles serão), se pagam no médio prazo.
O interesse que as empresas do setor privado manifestam nos leilões realizados para a concessão das obras é a maior demonstração de que o aproveitamento das águas é bom negócio, lucro garantido. E o argumento de que as usinas são levantadas com dinheiro público é tão desprovido de razoabilidade que nem vale a pena discutir.
Quanto aos impactos sociais, decerto a apreensão decorre da quantidade de empregados necessários à execução da obra (que ultrapassa as dezenas de milhares); e das condições de atendimento pelos serviços públicos disponíveis nos locais do empreendimento.
Seria insensato não reconhecer que o deslocamento de um contingente considerável de trabalhadores de uma determinada localidade para outra acarretará – tanto no local de origem quanto no do destino, diga-se – impactos sociais relacionados à oferta de serviços básicos de educação, saúde e segurança. Essa lógica, todavia, vale para qualquer empreendimento de grande porte, e não somente para as hidrelétricas.
Vale dizer, quando o Incra mobiliza milhares de famílias para ocupar, por exemplo, uma área rural na Amazônia, no âmbito de seus questionáveis projetos de colonização e reforma agrária, o impacto na rede estatal de serviços também é muito grande. O mesmo acontece quando é instalado um polo industrial e assim por diante. São problemas, contudo, que podem ser contornados mediante a implementação de ações mínimas de planejamento, não se prestando a inviabilizar o empreendimento.
O outro lado da questão concernente aos impactos sociais é que, pelo menos no caso da Amazônia, as localidades nas quais se constroem as usinas são, sem exceção, regiões esquecidas pelas políticas públicas; quando um lugar desses é destino de uma iniciativa do porte de uma hidrelétrica, é natural que a população espere plena satisfação de todas as demandas relacionadas à prestação de serviços básicos.
Ou seja, como a expectativa é por serviços de excelência onde antes não havia serviço nenhum, sempre haverá algum grau de frustração; entretanto, em todas as cidades onde uma hidrelétrica é construída, há significativa melhoria nas condições sociais, o que se reflete no aumento do IDH.
Finalmente, chegamos às refutações de cunho ambiental. Mais uma vez, seria insensato não admitir que a construção de uma barragem num rio, de forma a permitir a formação de um lago e a alteração do fluxo d’água, poderá causar problemas de adequação da fauna e da flora nesse novo ambiente gerado pela ação humana.
Mas, não se pode negar, tampouco, a capacidade de resiliência do meio hídrico, basta analisar as características ecológicas presentes em hidrelétricas com mais de dez anos de operação. Em muitas delas, inclusive, as condições ambientais para a conservação da ictiofauna longe de se agravar, melhoraram.
A máxima de que onde houver um rio e uma queda haverá uma hidrelétrica vale para um futuro cada vez mais próximo. Para a geração de energia elétrica, a força d’água ainda é o melhor caminho.
 

* Professor da Universidade Federal do Acre, Engenheiro Florestal, Especialista em Manejo Florestal e Mestre em Economia e Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná e Doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.

segunda-feira, 17 de março de 2014

Sobre o licenciamento ambiental de obras na Amazônia
* Ecio Rodrigues
Reza o senso comum que a exigência de uma série de estudos e levantamentos tornaria mais técnico e isento de discricionariedade política o extenso procedimento de licenciamento ambiental a que estão sujeitos os empreendimentos de infraestrutura levados a termo na Amazônia. Nada mais equivocado.

Esses levantamentos, como se sabe, são subsidiários à elaboração dos dois instrumentos exigidos do empreendedor para o licenciamento da obra: trata-se dos denominados “Estudos de Impacto Ambiental” e o consequente “Relatório de Impacto Ambiental”, documentos conhecidos pela sigla EIA/Rima.

As normativas vigentes determinam que o escopo dos estudos deve ser estabelecido por meio de termos de referência alvitrados pelo órgão licenciador. Ou seja, são os órgãos ambientais que definem o que deve ou não ser objeto de diagnóstico.

Como o raciocínio é no sentido de que, dependendo do resultado dos diagnósticos, a obra pode vir a ser desautorizada, a máxima seguida é a generalização: quanto mais levantamentos melhor, não importando critérios como custos e utilidade. Assim, chega-se ao cúmulo de exigir-se, por exemplo, diagnóstico de fauna para o licenciamento de uma linha de transmissão de energia elétrica, cujos efeitos sobre as espécies animais existentes no respectivo local são muito questionáveis, para não dizer insignificantes.

Entretanto, considerando-se que a decisão de realizar ou não determinada obra de infraestrutura é de natureza essencialmente política, o que acontece é que, quando é iniciado o processo de licenciamento, essa decisão já foi tomada. Portanto, ao invés de buscar a generalização, os órgãos ambientais deveriam primar pela especificidade, exigindo informações que relacionem a obra ao local da instalação.

Vale dizer, assumindo que os levantamentos que subsidiam o processo de licenciamento ambiental não alteram a discricionariedade dos gestores, a exigência por informações deveria se limitar ao seu principal objetivo: identificar e diminuir o impacto ambiental causado pela obra e por seus desdobramentos no futuro.

Então, o que se espera (ou se deve esperar) do licenciamento ambiental é o estabelecimento de medidas mitigadoras, cuja execução forneça lastro social ao empreendimento, propicie melhoria na dinâmica econômica dos municípios e contribua para minimizar a crise ecológica. Mas isso, em regra, não é o que acontece.

No caso, por exemplo, do licenciamento de uma obra de pavimentação de estrada na Amazônia, os estudos teriam como desígnio, em última análise, mitigar a profunda alteração de paisagem que ocorre no rastro desse tipo de empreendimento.

Sem embargo, é fato cientificamente comprovado que o asfaltamento de rodovias na Amazônia, a despeito dos numerosos levantamentos realizados para o licenciamento das obras, tem fomentado, entre outras consequências danosas ao meio, substituição de extensas áreas de florestas por pastagens, supressão de fluxos d’água e ampliação do desmatamento e das queimadas.

Enfim, se os levantamentos exigidos deveriam possibilitar a adoção de medidas para minorar as implicações ambientais trazidas pelas obras – que, todavia, continuam sendo extremamente impactantes, não obstante a realização dos estudos –, parece evidente que esses levantamentos estão sendo definidos arbitrariamente, sem qualquer critério ou base técnica.

A conclusão, frustrante, é que os documentos de EIA/Rima que instruem o licenciamento ambiental de obas de infraestrutura na Amazônia – e que são elaborados, diga-se, a um custo vultoso – não produzem resultado significativo, convertendo-se, em sua maior parte, em grossos volumes repletos de informações desnecessárias, que ninguém sequer chega a ler.

Nos moldes como são elaborados atualmente, os estudos exigidos para o licenciamento ambiental na Amazônia não têm serventia. É preciso, urgentemente, rever os critérios que os informam.


* Professor da Universidade Federal do Acre, Engenheiro Florestal, Especialista em Manejo Florestal e Mestre em Economia e Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná e Doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.

Livro Ciliar Só Rio Acre

Livro Ciliar Só Rio Acre