segunda-feira, 27 de janeiro de 2020



Para comemorar a nova década que está iniciando em 2020, e como forma de apresentar uma mostra da realidade vivenciada entre 2010 e 2019 – no que respeita à sustentabilidade da Amazônia –, foram selecionados e serão novamente postados, neste blog, artigos considerados representativos, entre os 48 publicados semanalmente, todos os anos, no site da Oscip Andiroba (http://www.andiroba.org.br/).
Dessa forma, um total de 10 artigos, um para cada ano da década passada, serão republicados, durante 10 semanas, a partir de 05 de janeiro.
Segue o quarto artigo da série, publicado originalmente em 30/06/2013:

Centro de Biotecnologia da Amazônia deveria ser prioridade
* Ecio Rodrigues
Erram os parlamentares que representam os interesses da Amazônia no Congresso quando tentam, sem sucesso, associar a Zona Franca de Manaus aos ideais de sustentabilidade preconizados para a região.
No limite do equívoco e do desespero para defender esse modelo de ocupação, sustentam que a industrialização trazida pela zona franca impediu o avanço do desmatamento no Amazonas.
Pífio argumento, uma vez que não existe vínculo direto entre desmatamento e industrialização. Esse vínculo só poderia ser invocado se houvesse comprovação de que os lucros gerados no processo industrial são investidos em ativos fundiários – condição que levaria à ampliação da pecuária e, portanto, ao aumento do desmatamento.
Ou seja, desmatamento tem, na verdade, relação direta com a pecuária, e todas as ações que promovem essa atividade produtiva levam, inexoravelmente, à destruição da floresta para dar lugar ao capim. Os efeitos decorrentes da pecuária na Amazônia estão fartamente comprovados na literatura científica sobre o tema da ocupação produtiva da região.
Por outro lado, toda atividade produtiva que pressupõe o aproveitamento dos recursos florestais promove a manutenção e a conservação do ecossistema florestal.
O caminho para alcançar algum tipo de sustentabilidade na Amazônia, incluindo-se aí as dimensões econômicas, ecológicas e sociais atribuídas ao termo, encontra-se no desenvolvimento de tecnologias e no estabelecimento de ambiente de negócios favorável ao manejo florestal de uso múltiplo da biodiversidade.
Foi justamente em face dessa constatação que, na segunda metade da década de 1990, foi elaborada a Política Nacional Integrada para a Amazônia Legal, conhecida pelo acrônimo Pnial. A Pnial chamou a atenção para a importância de iniciativas levadas a cabo sob a tutela do Estado e financiamento público, direcionadas para a estruturação de modelos de ocupação ancorados na exploração (por meio do manejo florestal, obviamente) da diversidade biológica presente na região.
Um grande esforço de política pública levou à concepção do Centro de Biotecnologia da Amazônia, CBA, um empreendimento que associaria a realização de pesquisas à formação de uma nova cadeia produtiva com base no aproveitamento florestal.
A ideia era que o CBA realizasse intensa prospecção de princípios ativos, a serem empregados na farmacologia e na indústria de pigmentos e de tinturas (para ficar nos usos mais promissores).
Parecia então evidente que, atuando num meio que envolve muita informação e, mais que isso, inteligência de mercado – algo de difícil assimilação em vista da insipiência da indústria biotecnológica no país –, o CBA não poderia operar sob as amarras e a costumeira ineficiência da gestão estatal, como acontece no caso das pesquisas desenvolvidas pelas universidades federais.
Para resolver o impasse, foi criada em 1997 a Bioamazônia, uma organização social que seria responsável pela gestão do CBA.
Mas, cometeu-se o erro capital de vincular-se a Bioamazônia ao Ministério do Meio Ambiente, famoso por sua incompetência em gerir processos produtivos, circunstância que se agravou no período pós-2003.
Bastou o questionamento dos termos de um acordo comercial celebrado entre a Bioamazônia e uma multinacional do ramo de biotecnologia, no final da década de 1990, para que tudo fosse por água abaixo. Não apenas o acordo foi cancelado, como foi deflagrado o processo de extinção da organização social.
Conclusão: passados mais de 15 anos, o CBA se arrasta, com (aproximadamente) meros 30% de sua estrutura em funcionamento e sem um modelo de gestão definido.
A prioridade para os políticos que se preocupam com a sustentabilidade da Amazônia deveria ser o CBA, única alternativa para a dita “zona franca verde”.

* Professor da Universidade Federal do Acre (Ufac), engenheiro florestal, especialista em Manejo Florestal e mestre em Economia e Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) e doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília (UnB).


segunda-feira, 20 de janeiro de 2020


Retrospectiva Sustentabilidade da Amazônia na última década: 2010 a 2019
Para comemorar a nova década que está iniciando em 2020, e como forma de apresentar uma mostra da realidade vivenciada entre 2010 e 2019 – no que respeita à sustentabilidade da Amazônia –, foram selecionados e serão novamente postados, neste blog, artigos considerados representativos, entre os 48 publicados semanalmente, todos os anos, no site da Oscip Andiroba (http://www.andiroba.org.br/).
Dessa forma, um total de 10 artigos, um para cada ano da década passada, serão republicados, durante 10 semanas, a partir de 05 de janeiro.

Segue o terceiro artigo da série, publicado originalmente em 19/02/2012:

* Ecio Rodrigues
Em uma data a ser lembrada, dia 09 de fevereiro de 2012, a política florestal amazônica sofreu um duro retrocesso. Sob argumentos pífios, uma lei aprovada pelos deputados do Acre pôs fim à única secretaria estadual de floresta existente no país.
Justificou-se que a extinção da SEF iria melhorar a gestão pública estadual. Algo inusitado, quando todos sabem que a administração pública brasileira – em todas as esferas – encontra grandes dificuldades para lidar com noções de eficiência, efetividade e eficácia.
Vale dizer, melhorar a gestão não é argumento para uma decisão que é essencialmente política.
Se a criação da SEF foi recebida como uma concreta oportunidade de fortalecer diretrizes econômicas ajustadas aos ideais de sustentabilidade, a extinção da pasta marca uma guinada perigosa em direção à expansão da agropecuária.
A lamentável iniciativa partiu do mesmo governo (ou da mesma concepção de governo) que havia instituído a inédita secretaria.
Trata-se de uma incoerência que leva à seguinte reflexão: ou a SEF foi criada por um arroubo de entusiasmo, sem que de fato houvesse demanda por uma mudança de referência na precária economia estadual, ou, então, o segmento majoritário da coligação que forma o governo não concorda com o modelo econômico indicado pela existência de uma secretaria de floresta.
Em face das justificativas dadas, o que transparece é que não houve grandes reflexões ou considerações – do mesmo jeito que, outrora, foi criada uma secretaria de extrativismo (que já não existe), ou mesmo a Secretaria de Agropecuária (que continua existir e se fortalece na própria existência), sem propósito definido, como medidas meramente eleitoreiras.
Chega a ser paradoxal que essa decisão tenha sido tomada num momento tão pouco propício, e justamente do ponto de vista político. Pois que o tema das florestas está em evidência no mundo inteiro, tendo obtido interesse sem precedentes desde que foi comprovada a importância das florestas tanto para a qualidade e quantidade da água que corre no leito dos rios como também para a retirada e imobilização do carbono presente na atmosfera.
Não à toa, a ONU declarou 2011 como “Ano Internacional das Florestas” e vem estimulando os países a promover discussões em torno do estabelecimento de novas governanças florestais – vale dizer, novos arcabouços institucionais capazes de reger e conduzir o tema das florestas.
No caso do Brasil, o setor florestal, responsável por produzir quase 5% do PIB nacional, reivindica com razão a criação de uma pasta específica, um “Ministério das Florestas”, já que o Ministério do Meio Ambiente tem se mostrado incompetente para gerir o assunto.
Diante desse contexto, certamente se esperava mais de um estado amazônico cujo legado inclui as reservas extrativistas, o manejo florestal comunitário e o manejo florestal de uso múltiplo – inovações desenvolvidas no Acre e reproduzidas mundo afora.
A conversão da SEF num departamento de um órgão maior, que por sua vez vai cuidar de todos e quaisquer assuntos relacionados às indústrias, de uma fábrica de plástico a uma usina de borracha, como se tudo fosse uma coisa só, evidencia a dimensão que o governo espera fornecer à política estadual de florestas – ou seja, nenhuma.
Ainda há saída. Que os indivíduos e organizações que conhecem a realidade florestal no Acre logrem conferir à política florestal o reconhecimento que o governo está negando.

* Professor da Universidade Federal do Acre (Ufac), engenheiro florestal, especialista em Manejo Florestal e mestre em Economia e Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) e doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília (UnB).

segunda-feira, 13 de janeiro de 2020



Para comemorar a nova década que está iniciando em 2020, e como forma de apresentar uma mostra da realidade vivenciada entre 2010 e 2019 – no que respeita à sustentabilidade da Amazônia –, foram selecionados e serão novamente postados, neste blog, artigos considerados representativos, entre os 48 publicados semanalmente, todos os anos, no site da Oscip Andiroba (http://www.andiroba.org.br/).
Dessa forma, um total de 10 artigos, um para cada ano da década passada, serão republicados, durante 10 semanas, a partir de 05 de janeiro.
Segue o segundo artigo da série, publicado originalmente em 13/11/2011:

Amazônia e políticas florestais de segunda geração
* Ecio Rodrigues
Na Amazônia, a maioria dos estados possui um instrumento de política florestal, geralmente instituído na forma de legislação. Ainda assim, a suposta ausência de diretrizes públicas para o setor florestal é sempre apontada como a principal causa das dificuldades observadas na produção madeireira.
A sociedade, desse modo, continua cobrando dos agentes públicos e privados maior atenção na exploração florestal, em especial no que se refere à extração de madeira.
Ora, se as políticas já foram, em tese, discutidas com a sociedade e aprovadas por seus representantes, essa insatisfação social só pode ser creditada à falta de ajustamento de tais diretrizes à realidade vivenciada no cotidiano da produção.
De fato, as políticas florestais em vigor nos estados amazônicos, ditas de primeira geração, foram concebidas há mais de 20 anos – quando a ilegalidade e o primitivismo tecnológico imperavam no setor florestal. Atualmente, a situação é muito diferente, sendo que mais de 90% da exploração madeireira é efetuada por meio da tecnologia do manejo florestal.
A despeito da existência de normas que regulam a atividade florestal, boa parte da população segue acreditando que os procedimentos relacionados à comercialização da madeira (que incluem derrubar árvores com o uso de motosserras, efetuar o seu arraste pela floresta por meio de tratores do tipo skider, e transportar sobre treminhões as toras para as áreas urbanas) ainda deixam para trás um rastro de destruição. E se há destruição, a responsabilidade recairia sobre os empresários e, por tabela, sobre os agentes públicos, que não estariam inibindo a atuação do empresário destruidor.
No âmbito da atividade madeireira, mais do que no de qualquer outra atividade produtiva, é quase que corriqueira a ocorrência de situações que atraem certo sensacionalismo: vez por outra, a imprensa traz alguma notícia que põe em xeque, perante uma sociedade que sempre está com um “pé atrás”, a atividade florestal e a eficácia das políticas públicas para o setor.
Ultimamente, tem causado celeuma no Acre a publicação de uma série de matérias, umas com evidente viés político-eleitoral, outras na forma de desprezíveis insinuações panfletárias, questionando o projeto levado a efeito na Floresta Estadual do Antimary – um dos mais importantes projetos de manejo florestal realizados na Amazônia, e cuja concepção metodológica, inclusive, serviu de base técnica para elaboração da política florestal local, aprovada pelos parlamentares estaduais há quase 10 anos.
Não deixa de ser sintomático o fato de se deturpar, de forma grosseira, uma experiência tão significativa para o estado.
Duas lições podem ser extraídas do episódio, que podem muito bem ser aplicadas ao contexto amazônico.
1) Se existe, em esfera local, aprovada e sancionada em lei, uma política pública florestal que orienta a produção de madeira e a adoção da tecnologia do manejo florestal, e ainda assim a população dá crédito a matérias sensacionalistas, é possível que essa política, ao priorizar investimentos em empresas intensivas em capital e tecnologia, esteja superada, devendo ser revista.
2) Existe uma resistência generalizada e insuperável na sociedade, que faz com que a exploração de madeira seja sempre contemplada como algo danoso, independentemente da tecnologia empregada.
No final das contas, seja em razão das deficiências presentes nas políticas florestais em vigor, seja em vista da enraizada oposição social à exploração de madeira, uma coisa é certa: é chegado o momento das políticas florestais de segunda geração.

* Professor da Universidade Federal do Acre (Ufac), engenheiro florestal, especialista em Manejo Florestal e mestre em Economia e Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) e doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília (UnB).


quinta-feira, 2 de janeiro de 2020



Em 2019, escalada do desmatamento afasta Amazônia da sustentabilidade
* Ecio Rodrigues
A contar de 1988, quando o Inpe começou a medir anualmente o desmatamento na Amazônia, 2012 foi o ano em que se apurou a menor área de floresta destruída – menos de 5.000 Km2. Desde então, houve um esforço para que esse limite não voltasse a ser ultrapassado.
Todavia, o feito daquele ano jamais se repetiu. E ainda que a taxa de desmatamento tenha apresentado certa oscilação a partir de 2012, pode-se dizer que a destruição florestal aumentou quase que continuamente, até disparar agora, em 2019, tendo atingido 9.762 km2 – um aumento de 29,5% em relação ao ano anterior e um recorde em valores absolutos para os últimos 10 anos.
Tanto o movimento ambientalista quanto pesquisadores, com base em dados levantados mês a mês por satélites, já vinham alertando para a tendência de alta – que acabou se confirmando, a despeito das reiteradas negativas do Ministério do Meio Ambiente, MMA.
Diante do atual contexto político, a preocupação da hora está relacionada à possibilidade de ocorrência de novos recordes extremos, como os observados em 1995 e 2004.
Acontece que a taxa de desmatamento medida em 2019 compreende o intervalo que vai de 01/08/2018 a 31/07/2019. Nesse período, o MMA passou de uma gestão bastante competente (5 meses de 2018) a outra inqualificável (7 meses de 2019).
Há pelo menos três evidências que comprovam a responsabilidade dos atuais gestores ambientais no que respeita à preocupante escalada assumida pela destruição florestal na Amazônia.                                                           
A primeira se refere ao questionamento e paralização do Fundo Amazônia, um crucial e reconhecido instrumento público de captação de recursos, vinculado ao próprio MMA, pelo qual o país arrecada doações internacionais destinadas ao controle do desmatamento.
A segunda alude à absurda campanha difamatória promovida pelo MMA contra ONGs ambientalistas, acusando essas organizações – que se dedicam a combater o desmatamento e a fomentar alternativas produtivas à pecuária – de conspirar para saquear e destruir a região.
Por fim, a terceira evidência – a mais grave, por sinal – remete à omissão, pura e simples.
Não foram poucas as ocasiões em que os gestores do MMA e o primeiro escalão governamental demonstraram cabal indiferença quanto ao problema do desmatamento na Amazônia.
Para o governo, a mazela ambiental da região se resume à ausência de saneamento básico. O controle do desmatamento, portanto, é agenda adstrita a países europeus, não configurando prioridade para o orçamento federal.
Postura semelhante foi adotada em relação às queimadas, em julho passado. Mas a repercussão negativa – que chegou mesmo a originar uma crise política – fez o Planalto recuar em suas retrógradas posições.
Entretanto, como desmatamento não faz fumaça e não chama a atenção, não há limites para a indolência e desfaçatez do governo. Argumentos que contrapõem o desmatamento ao progresso, coisa da década de 1970 e que há muito perdeu a validade, são repetidos descaradamente.
Por isso, é mais que legítima a preocupação em torno de uma ampliação recorde na destruição florestal em 2020. Alertas vêm sendo feitos, e as estatísticas preliminares não trazem boas notícias.
A esperança está na resposta dos países europeus que mantém relação comercial com o Brasil – que podem impor barreiras ao agronegócio tupiniquim.
No que depender do governo federal, a floresta amazônica será destruída.

*Professor Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro florestal, especialista em Manejo Florestal e mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná, e doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.

Livro Ciliar Só Rio Acre

Livro Ciliar Só Rio Acre