quinta-feira, 24 de janeiro de 2013


Sobre a hidrovia dos rios Madeira e Amazonas

* Ecio Rodrigues
         É muito grande a circulação de cargas e pessoas pelo rio Amazonas. A quantidade de embarcações (de todos os tamanhos e destinadas a todo o tipo de transporte) que atracam ao longo da orla fluvial do Porto de Itacoatiara, por exemplo, desafiam as tentativas de monitoramento e controle.
Recebendo embarcações que saem de Porto Velho, em Rondônia, e deságuam no rio Amazonas, o Porto de Itacoatiara está em constante movimento; afinal, é por ali que trafega grande parte da economia regional.
Uma dinâmica econômica que é movida pela existência da única via de ligação entre Manaus e Belém, a fluvial. É por essa via que são escoadas, por exemplo, os grãos de soja colhidos em Rondônia.
E como as empresas da Zona Franca são montadoras, é por essa via também que chegam as peças e equipamentos que são montados em Manaus, e que saem todas as manufaturas e quinquilharias ali produzidas.
Barcas com 10, 20, 100 contêineres navegam pelo rio, conduzidas por rebocadores de grande calado. Vão atracar em Belém, de onde continuarão navegando, através do oceano Atlântico, em busca dos mercados internacionais, ou irão tomar as rodovias para atender ao mercado nacional.
Uma discussão tem sido travada por ambientalistas contrários à instalação de uma hidrovia que abrangeria os rios Purus, Madeira e Amazonas. Todavia, os argumentos levantados não têm cabimento, por várias razões.
O principal argumento é que o rio se transformaria em um modal de transporte, que, tal como acontece com as rodovias, serviria para o transporte de cargas e de pessoas, o que colocaria em risco a função ambiental do recurso fluvial.
Alegação precária, que não resiste à constatação de que o rio já é usado para esse fim: não será a hidrovia que tornará o rio a principal via de escoamento, pois ele já o é. Que a hidrovia pode ampliar e promover esse modal fluvial, não há dúvida; que isso poderá incrementar em 20 ou 30% a quantidade da cabotagem atual, também não há a menor dúvida.
Por outro lado, esse incremento de cabotagem seguramente virá associado ao cuidado com o rio. A hidrovia oficializará (digamos assim) a condição do rio como via de acesso essencial para a região. Implica dizer que o rio não poderá estar assoreado, o que exigirá cuidado com a mata ciliar, algo impensável atualmente.
Significa que o rio não poderá ter sua vazão ou equilíbrio hidrológico comprometido, pois, do contrário, não haverá transporte fluvial. Significa também que o rio não poderá desbarrancar (sem a proteção conferida pela mata ciliar); e que as cidades e povoados terão que obrigatoriamente dispor de portos estruturados para acomodar passageiros, com, no mínimo, ambientes distintos para embarque e desembarque. Nada disso existe hoje, a despeito de o rio ser usado como via de transporte e escoamento.
Além de organizar o deslocamento, com controle de cargas e de pessoas, sinalização e estruturação, a hidrovia possibilitará que se confira transparência às condições do rio, na medida em que serão geradas informações necessárias à gestão da via fluvial.
A hidrovia é uma concessão pública. Da mesma forma como ocorre no caso da aviação e das autoestradas, trata-se de um serviço público que precisa ser licitado e outorgado a uma empresa – que, por seu turno, explora esse serviço por um período de tempo determinado. Evidentemente, essa empresa irá cobrar do usuário e pagar a concessão para o poder público. É assim que funciona em todo o mundo.
Instituir um sistema de pagamentos pela conservação da mata ciliar pode resolver uma série de problemas no rio, mas, sem a hidrovia, isso nunca acontecerá. 
     
* Professor da Universidade Federal do Acre (Ufac), Engenheiro Florestal, Especialista em Manejo Florestal e Mestre em Economia e Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) e Doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília (UnB).

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