Na alagação, sobra água ou sobra chuva?
* Ecio Rodrigues
Assim como no verão, de junho a setembro, a pergunta seria: falta água ou falta chuva? Parece simples, mas trata-se de um ponto crucial para que o Rio Acre não caia na ira da população. Um conceito, literalmente, divisor de águas, para tratar o tema das alagações e da seca nos rios amazônicos. Afinal, não se pode esquecer que houve prefeito que até pensou em tirar o Rio Acre da cidade e mudar seu curso para o Bujari.
Uma solução, seguramente, inócua essa da mudança de curso. Atualmente impensável, mas que era um tipo de resposta comum na década de 1970, quando tudo se resolvia no concreto armado. Na era pós Eco-92 qualquer medida drástica, nas condições naturais existentes, é recebida como ataque frontal aos ideais de sustentabilidade do planeta.
Voltando à pergunta do título, ao afirmar que ora sobra e ora falta chuva, coisas normais no inverno e verão amazônicos, reforça-se a idéia de que se trata de um processo natural. O velho e tradicional jargão: no Acre e na Amazônia é assim mesmo, vem logo à mente.
A responsabilidade ou a culpa por alagar ou secar, nesse caso, recai sobre um sem número de endereços desconhecidos. Ou foi São Pedro, que dizem, administra a chuva, ou foi o próprio clima, que é assim mesmo, ou foi o famoso e recente casal el niño e la niña, ou, ainda, foi o mais importante causador de tudo que é problema ambiental no mundo: o desequilíbrio climático.
Todavia, o mais importante, é que as pessoas de carne e osso, as populações, os dirigentes e as autoridades em geral, são redimidos da obrigação de tentar resolver, são, por assim dizer, absolvidos, devido a mais completa ausência de governabilidade sobre os já citados São Pedro, desequilíbrio climático... Assim a discussão sobre o tema é rapidamente abortada.
Já no segundo caso, isto é, se a resposta é de que falta ou sobra água não é bem assim. Se há excesso de água no leito do Rio Acre, ou por outro lado, se o Rio Acre não esta conseguindo absorver a vazão atual é porque alguma transformação, grave, vem ocorrendo nas características ambientais dessa bacia hidrográfica.
A discussão agora rende muito e ganha força no questionamento dos dois maiores problemas ambientais do Acre: o desmatamento e sua irmã, a queimada. O processo de ocupação ao longo da área de influência da bacia hidrográfica do Rio Acre favoreceu a retirada da cobertura florestal o que, como todo mundo sabe, gera assoreamento (deixando o leito do Rio mais raso e por isso cabendo menos água).
Além disso, a ausência da mata ciliar, aquela vegetação, que ocorre nas margens dos rios e igarapés, aumenta a quantidade de água que chega diretamente ao fluxo de água. Ou seja, cabe menos água ao mesmo tempo em que chega mais água ao leito do Rio. Sem exagero algum, duas excelentes razões para alagação, ou seca.
Um agravante ainda maior, essa mata ciliar é denominada de Área de Proteção Permanente, APP, e são protegidas pelo Código Florestal de 1965. Ou seja, é proibido, sujeito à multa e outras penalidades, o seu desmatamento.
Dada às condições de desmatamento acentuado nas margens do Rio Acre, não é preciso muito esforço para achar endereços, e muitos, para a responsabilidade e a culpa.
E são tantos endereços, que é melhor o problema ser mesmo a chuva.
(*) Engenheiro Florestal, Especialista em Manejo Florestal e Mestre em Economia e Política Florestal pela UFPR e Doutor em Desenvolvimento Sustentável pela UnB. É professor da Ufac.
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