Acre em chamas
* Ecio Rodrigues
Nos idos de 2005, este articulista iniciou a
publicação de uma série de artigos, com o propósito de alertar para os riscos
da nefasta prática agrícola da queimada, como parte de uma campanha solitária –
e obviamente fracassada –, intitulada “Para o Acre não queimar em 2010”.
Esse interstício de cinco anos não era por acaso.
Ocorre que os gestores públicos de então – por
sinal, os mesmos de agora – usavam dois argumentos, até hoje reiterados, para justificar
seu imobilismo na contenção do alastramento dos focos de calor.
Primeiro, que, para parar de vez o licenciamento das
queimadas nas pequenas, médias e grandes propriedades, seria necessário um
período de transição.
Defendia-se que o governo não poderia proibir o produtor
de queimar, sem antes colocar à disposição dele uma alternativa produtiva – como
o maquinário necessário à mecanização de seus cultivos. Do contrário, o produtor
iria passar fome.
É aí que entrava o segundo argumento.
“Queimar para não passar fome”, essa lógica
perversa foi o subterfúgio empregado para comover a população urbana, levando-a
a acreditar na falácia de que o pequeno produtor rural era/é esfomeado.
Tentando explicar melhor. Sem motivação econômica
para produzir o arroz, o feijão, o milho e a macaxeira de sempre, o produtor
precisava desmatar e queimar a floresta, com o intuito meramente de ter o que
comer.
Tratava-se – os gestores repetiam para demonstrar suposta
sensibilidade social – de uma produção para subsistência. Por isso, para saciar
a fome, o produtor podia causar tamanho prejuízo ambiental, econômico e social,
ao fazer uso das queimadas.
Contudo, a realidade comprovou que nada disso era verdade.
A prática da queimada é um investimento que o produtor – o pequeno, o médio e o
grande – faz para melhorar, ampliar e valorizar sua produção (principalmente a
criação de boi), e, como não poderia ser diferente, aumentar sua renda.
Passaram-se os anos, 2010 ficou para trás. De lá para
cá, o Acre bateu recorde de queimadas em 2016, a tendência de elevação se
manteve em 2017 e, a julgar pela inoperância estatal, vai permanecer.
Setembro tem sido doloroso para quem vive no Acre. Que
ninguém se esqueça, porém: o mês de outubro de 2017 foi o outubro com mais
focos de calor desde 1998, quando o prestigiado Inpe iniciou as medições.
Em 2018, o Acre queimou acima da média de 20 anos
nos meses de maio, junho, julho e, desde o dia 13, também neste mês de setembro.
Nos últimos anos, cidades do interior como Tarauacá
e Feijó vêm figurando entre os 10 municípios que mais queimam na Amazônia, e o
Acre tem disputado a liderança no número de focos de calor com Rondônia e Mato
Grosso.
Mas há uma diferença significativa, posto que lá
(em Rondônia e Mato Grosso), o agronegócio se consolidou, enquanto aqui não existe
uma produção agropecuária minimamente digna.
Sob um misto de omissão e incompetência, os
gestores públicos, os de antes e os de agora, não conseguem acabar com as
queimadas nem estimular a agropecuária.
É o pior dos mundos.
*Professor
Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro florestal, especialista
em Manejo Florestal e mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do
Paraná, e doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de
Brasília.
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