O desmatamento no
Acre e a doação da Noruega para a Amazônia
* Ecio Rodrigues
Nos
últimos dias foi noticiado que a Noruega cortou pela metade os recursos doados
ao Brasil em 2017 (equivalentes a R$ 200 milhões), sob a justificativa de que o
desmatamento da Amazônia aumentou 29% em 2016, em relação ao período anterior.
Como
sempre apressada e simplista, a imprensa reportou o desmatamento da Amazônia, uma
das maiores e mais importantes formações florestais do planeta, como apenas um
graveto a mais na fogueira de queimação do governo, sem a menor preocupação em esclarecer
minimamente o assunto.
Parece,
inclusive, existir um senso comum, segundo o qual tudo se resume à política,
entendendo-se por política a arte de corromper: uma vez que todos são
corruptos, o que importa é derrubar quem quer que se encontre na Presidência da
República, e o país que se afogue no poço da instabilidade.
Sim,
o desmatamento aumentou na Amazônia, pondo em risco o reconhecimento internacional
do Brasil. Mas, entre as causas desse aumento, despontam a crise econômica e a instabilidade
política promovida pelos que são contrários às reformas e a tudo que possa nos
tirar do atoleiro.
Deixando
de lado a discussão infrutífera que move a imprensa, cabe uma pitada de
informação, então vamos lá.
O
Fundo Amazônia, que é gerido pelo BNDES, é abastecido todos os anos por doações
de países desenvolvidos, sendo Noruega e Alemanha os principais doadores. Trata-se
de doação, já que os recursos financeiros são transferidos a fundo perdido, e
não a título de empréstimo ou financiamento. A contrapartida assumida pelo Brasil
pode ser sintetizada na obrigação de reduzir o desmatamento na Amazônia.
Abram-se aqui parênteses. Acontece que no Brasil existe
o desmatamento legalizado, que é realizado sob os auspícios da legislação. É um
grande contrassenso, pois enquanto for permitido por lei, o desmatamento nunca
– nunca! – será zerado. Mas como o país não discute nem assume esse
desmatamento legalizado, faz uma espécie de “pegadinha” com a cooperação
internacional.
Tanto
é verdade que no âmbito do Acordo de Paris, o Brasil, ladinamente, se
comprometeu a zerar o desmatamento ilegal
na Amazônia até 2030. Ou seja, mesmo que esse compromisso seja honrado, a
sociedade terá que conviver com uma taxa anual (e bastante significativa,
diga-se) de desmatamento da floresta.
Talvez esteja aí a razão pela qual não se discute o desmatamento
legalizado – tal discussão remeteria à constatação de que, a bem da verdade,
nós aceitamos e justificamos o desaparecimento da floresta. Se a questão fosse
enfrentada, fatalmente teríamos que responder uma pergunta bastante
inconveniente, a saber: que extensão de destruição florestal a sociedade
brasileira está disposta a tolerar todos os anos?
Desde
1988 o Brasil mede a área desmatada na Amazônia. A última taxa, essa que
apontou o aumento de 29%, abrange o período entre agosto/2015 e julho/2016. A
divulgação da taxa de 2017 (cuja medição se encerra em 31 de julho próximo)
está prevista para novembro e certamente influenciará futuras decisões dos
doadores.
Mas,
e o Acre com isso? Bem, os dois estados amazônicos que mais colaboraram para a
ampliação do desmatamento em 2016 foram Acre e Amazonas (que ostentaram, respectivamente,
47% e 54% de aumento na destruição florestal).
A
responsabilidade pelo desmatamento anual deve ser partilhada entre os
governadores dos 9 estados amazônicos – esta é uma condição precípua para
mobilizar a sociedade local e pressionar os gestores públicos.
Afinal,
não há dúvida científica de que o desmatamento é induzido por políticas
públicas que valorizam a criação de boi em detrimento da vocação florestal da
região e que são adotadas, em primeiro lugar, por governadores e prefeitos.
Perder
o dinheiro da cooperação internacional é um dos efeitos do quadro perverso do
desmatamento florestal da Amazônia, há piores.
*Professor Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro
florestal, especialista em Manejo Florestal e mestre em Política Florestal pela
Universidade Federal do Paraná, e doutor em Desenvolvimento Sustentável
pela Universidade de Brasília.
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