Sobre o licenciamento
ambiental de obras na Amazônia
* Ecio Rodrigues
Reza o senso comum que a exigência de uma
série de estudos e levantamentos tornaria mais técnico e isento de
discricionariedade política o extenso procedimento de licenciamento ambiental a
que estão sujeitos os empreendimentos de infraestrutura levados a termo na
Amazônia. Nada mais equivocado.
Esses levantamentos, como se sabe, são
subsidiários à elaboração dos dois instrumentos exigidos do empreendedor para o
licenciamento da obra: trata-se dos denominados “Estudos de Impacto Ambiental”
e o consequente “Relatório de Impacto Ambiental”, documentos conhecidos pela
sigla EIA/Rima.
As normativas vigentes determinam que o escopo
dos estudos deve ser estabelecido por meio de termos de referência alvitrados pelo
órgão licenciador. Ou seja, são os órgãos ambientais que definem o que deve ou
não ser objeto de diagnóstico.
Como o raciocínio é no sentido de que,
dependendo do resultado dos diagnósticos, a obra pode vir a ser desautorizada, a
máxima seguida é a generalização: quanto mais levantamentos melhor, não
importando critérios como custos e utilidade. Assim, chega-se ao cúmulo de
exigir-se, por exemplo, diagnóstico de fauna para o licenciamento de uma linha
de transmissão de energia elétrica, cujos efeitos sobre as espécies animais
existentes no respectivo local são muito questionáveis, para não dizer
insignificantes.
Entretanto, considerando-se que a decisão de
realizar ou não determinada obra de infraestrutura é de natureza essencialmente
política, o que acontece é que, quando é iniciado o processo de licenciamento, essa
decisão já foi tomada. Portanto, ao invés de buscar a generalização, os órgãos
ambientais deveriam primar pela especificidade, exigindo informações que
relacionem a obra ao local da instalação.
Vale dizer, assumindo que os levantamentos que
subsidiam o processo de licenciamento ambiental não alteram a discricionariedade
dos gestores, a exigência por informações deveria se limitar ao seu principal
objetivo: identificar e diminuir o impacto ambiental causado pela obra e por
seus desdobramentos no futuro.
Então, o que se espera (ou se deve esperar) do
licenciamento ambiental é o estabelecimento de medidas mitigadoras, cuja
execução forneça lastro social ao empreendimento, propicie melhoria na dinâmica
econômica dos municípios e contribua para minimizar a crise ecológica. Mas
isso, em regra, não é o que acontece.
No caso, por exemplo, do licenciamento de uma
obra de pavimentação de estrada na Amazônia, os estudos teriam como desígnio, em
última análise, mitigar a profunda alteração de paisagem que ocorre no rastro
desse tipo de empreendimento.
Sem embargo, é fato cientificamente comprovado
que o asfaltamento de rodovias na Amazônia, a despeito dos numerosos levantamentos
realizados para o licenciamento das obras, tem fomentado, entre outras
consequências danosas ao meio, substituição de extensas áreas de florestas por
pastagens, supressão de fluxos d’água e ampliação do desmatamento e das queimadas.
Enfim, se os levantamentos exigidos deveriam
possibilitar a adoção de medidas para minorar as implicações ambientais trazidas
pelas obras – que, todavia, continuam sendo extremamente impactantes, não
obstante a realização dos estudos –, parece evidente que esses levantamentos estão
sendo definidos arbitrariamente, sem qualquer critério ou base técnica.
A conclusão, frustrante, é que os documentos
de EIA/Rima que instruem o licenciamento ambiental de obas de infraestrutura na
Amazônia – e que são elaborados, diga-se, a um custo vultoso – não produzem
resultado significativo, convertendo-se, em sua maior parte, em grossos volumes
repletos de informações desnecessárias, que ninguém sequer chega a ler.
Nos moldes como são elaborados atualmente, os estudos
exigidos para o licenciamento ambiental na Amazônia não têm serventia. É
preciso, urgentemente, rever os critérios que os informam.
* Professor da Universidade Federal do Acre,
Engenheiro Florestal, Especialista em Manejo Florestal e Mestre em Economia e
Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná e Doutor em
Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.
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