segunda-feira, 18 de novembro de 2013

Os portugueses e o mercado da rolha de cortiça
* Ecio Rodrigues
A região de Coruche, em Portugal, intitula-se “Capital Mundial da Cortiça”, por abrigar uma extensa área coberta por Montado de Sobreiro, um sistema de produção tradicional, que consorcia árvores que produzem cortiça com espécies forrageiras, usadas para pastoreio animal, e outras culturas de ciclo curto.
Na condição de uma das maiores produtoras de cortiça e com uma expressiva indústria de rolha de cortiça ali instalada, Coruche lança diariamente no mercado cinco milhões de rolhas que são exportadas, sobretudo, para fins de vedação das garrafas que embalam o vinho produzido em França, Itália, Argentina, e assim por diante.
Em Coruche existe, ainda, um centro de negociação dedicado à cortiça (o Observatório do Sobreiro e da Cortiça), e é organizada, periodicamente, a Feira Internacional da Cortiça.
Além de Coruche, outras regiões portuguesas são dependentes da produção de cortiça que há séculos é praticada sob esse modelo de sistema agrosilvopastoril denominado Montado de Sobreiro. Um sistema de produção que goza de alguma similaridade com os Sistemas Agroflorestais existentes na Amazônia brasileira, voltado para a produção de pupunha, por exemplo.
Ocorre que a cortiça – que tem em Portugal seu maior expoente internacional, uma vez que 50% da cortiça que abastece a demanda do mercado mundial é de origem portuguesa – é produzida a partir de uma espécie florestal, o sobreiro, ou Quercus suber, do gênero do carvalho.
Esse tipo de cobertura florestal representa 21% de toda a área ocupada por florestas em Portugal, encontrando-se, com maior expressão, na parte central e sul do país, nas regiões conhecidas como Ribatejo e Alentejo, sob a influência do rio Tejo.
Tal como ocorre com alguns produtos florestais, a cortiça passa por momentos difíceis de mercado, em face de sua substituição por matéria-prima sintética.  
Com efeito, a cortiça tem sido substituída por isopor e plástico, entre outros materiais oriundos da poluente e exaurível indústria do petróleo. É provável que esteja na fabricação de rolha o derradeiro e mais importante uso da cortiça, sendo que Portugal também é o maior produtor mundial.
A produção de cortiça é sustentável, pois se trata de matéria-prima extraída da casca de uma árvore. Essa casca se renova de tempos em tempos, e as técnicas de manejo florestal que garantem que a extração ocorra sem pôr em risco a própria árvore foram estudadas e desenvolvidas pelos engenheiros florestais europeus, sobretudo os portugueses.
A produção de rolha de cortiça, por sua vez, ajusta-se aos ideais de sustentabilidade preconizados no mundo porque o manejo florestal da árvore de Quercus suber é largamente praticado no Montado de Sobreiro. Ou seja, a quantidade de sobreiros atualmente existente e em condições de ser manejada é suficiente para garantir a oferta sustentável de cortiça para as suas variadas aplicações em todo o mundo.
Finalmente, após o seu uso – seja como rolha ou outra aplicação qualquer, como na poderosa indústria de decoração ou na de artesanato –, a cortiça descartada transforma-se em matéria orgânica para a adubação de solos agricultáveis.
 A poluente indústria do petróleo, por outro lado, logrou produzir uma rolha de plástico, com preços inferiores aos da cortiça, mas cujo processo de produção e de descarte aumenta de forma perigosa a quantidade de carbono jogada na atmosfera.
A fim de manter sua produção de cortiça, a estratégia dos portugueses tem sido alertar para o risco de alteração no clima provocado pela rolha de plástico. Será que dará certo?


* Professor da Universidade Federal do Acre (Ufac), Engenheiro Florestal, Especialista em Manejo Florestal e Mestre em Economia e Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) e Doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília (UnB).

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