Código Florestal: sobre
rios temporários e acordos possíveis
* Ecio Rodrigues
Ceder alguns dedos para não perder os anéis, ou é o contrário, é comum no
processo de negociação política, em especial quando essa negociação envolve o
tardio dilema existente entre conservar florestas ou ampliar a produção
agropecuária. Ocorre que o solo, infelizmente, é um só, o que significa dizer
que onde há florestas não poderá haver criação de boi e vice-versa.
Parece que foi o que aconteceu dia 29 de agosto, quando os muitos,
diga-se, parlamentares que se definem como ruralistas, não por serem produtores
rurais, mas por acreditarem que a estratégia de desenvolvimento do país é a
produção de grãos de soja e carne de boi, por exemplo, conseguiram convencer os
parlamentares que se definem como não ruralistas, uma vez que não existe uma
bancada de parlamentares ambientalistas, a aprovarem um novo texto da Medida
Provisória conhecida por MP do Código Florestal.
É muito difícil explicar o processo legislativo nacional que faz com que
uma proposta de novo instrumento legal, tenha intermináveis idas e vindas entre
a Câmara dos Deputados e o Senado, com a intermediação, vez ou outra, da
Presidente da República. É desafiador para o cidadão conseguir acompanhar e,
claro, entender o que acontece por lá.
Mas, a novela em que se tornou o Código Florestal é, mais ou menos, a
seguinte. O primeiro ponto importante é que a justificativa, para se discutir
uma nova Lei florestal para o país, foi que uma boa parte dos produtores rurais
estão ilegais, perante a Lei que vige. Sendo assim, a nossa sabedoria afirma
que se o produtor não cumpre a Lei, melhor mudar a Lei, com uma nova.
Assim, em maio de 2011 os deputados aprovaram uma proposta de novo Código
Florestal, absurda em três pontos: anistiava os produtores das multas pela
ilegalidade, reduzia ao mínimo as florestas das margens dos rios e quase
acabava com a exigência de manutenção das florestas existentes nas áreas de Reserva
Legal, equivalentes na Amazônia, a 80% da área total da propriedade privada.
Os senadores consideraram a proposta pouco elaborada, sobretudo do ponto
de vista técnico, e incluíram uma série de mecanismos considerados modernos,
para ampliar a valorização dos ativos florestais, flexibilizar a anistia com o
parcelamento da dívida, mas mantendo a obrigação de pagar, e recuperando a
exigência da mata ciliar e da Reserva Legal.
Ao voltar para Câmara em caráter terminativo, a proposta dos senadores
foi repudiada pelo deputados, que, magoados com o acordo feito no Senado,
aprovaram novamente, sua própria versão, com a redação tacanha que havia sido
entregue aos senadores.
Coube à presidência da república vetar a parte do texto dos deputados
referente à anistia, mata ciliar e Reserva Legal, transformando esses artigos
na Medida Provisória 571/12, que se encontra, agora, em análise na Comissão
Mista do Congresso Nacional.
Enfim, a proposta aprovada pela Comissão Mista, que deverá ser votada
pelo plenário da Câmara e do Senado, altera a largura de mata ciliar exigida
nas propriedades rurais, reduzindo, obviamente, a quantidade de florestas.
Os parlamentares não ruralistas tiveram que entregar os dedos, para não
perderem os anéis, porque os ruralistas ameaçavam aprovar o fim da mata ciliar
em rio que seca, os denominados intermitentes, o que traria um prejuízo
incalculável à manutenção dos recursos hídricos no país.
Aceitou-se, diminuir as florestas que protegem os rios que não secam na
seca, para manter a proteção, com um mínimo de florestas para os rios que
secam.
Um acordo que sairá caro ao país, ao retirar a proteção das florestas
para um recurso estratégico: a água. O movimento Veta Dilma de Novo, já
começou.
* Professor da
Universidade Federal do Acre (Ufac), Engenheiro Florestal, Especialista em
Manejo Florestal e Mestre em Economia e Política Florestal pela Universidade
Federal do Paraná (UFPR) e Doutor em Desenvolvimento Sustentável pela
Universidade de Brasília (UnB).
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