* Ecio Rodrigues
Há
30 anos, no mínimo, que, todos os anos, no período entre julho e outubro, em
especial para o caso da região localizada na calha sul da bacia do rio
Amazonas, surge a saída mágica para resolver os problemas do desmatamento e das
queimadas na Amazônia: conscientizar o produtor rural.
Em
dado momento dessa repetida pantomima, o governo parece incorporar o espírito
de uma organização não governamental e, quase sempre para se defender, diante
da realidade científica estampada nas imagens de satélite divulgadas pelo Inpe,
inicia a pregação sobre a “solução” representada por uma campanha de
conscientização.
Vêm
à tona termos associados à psicologia social, tais como sensibilização e
convencimento, que aparentemente surtem efeito no imaginário das populações
urbanas, sobretudo daquelas residentes no Sul e Sudeste.
Indo
além, a mágica da conscientização contamina os profissionais da imprensa, que,
num completo lapso de memória quanto ao que foi feito no ano anterior e nos
precedentes, em geral consideram satisfatória a resposta do governo.
Sem
embargo, e como todos os calejados extensionistas rurais bem o sabem (embora
nunca sejam consultados), tudo não passa de perda de tempo e de dinheiro.
Em
fevereiro deste ano de 2020, o governo, pressionado por conta de sua manifesta
paralisia decisória, e sob o pretexto de impulsionar medidas para o controle do
desmatamento e das queimadas na Amazônia, decidiu transferir o CNAL (Conselho
Nacional da Amazônia Legal) do Ministério do Meio Ambiente para a alçada da
Vice-Presidência da República.
A
mudança foi consumada por meio do Decreto 10.239/2020. De quebra, também foi
transferida uma importante, senão a principal, fonte de recursos para coibir a destruição
da floresta na região – o Fundo Amazônia, gerido pelo competente BNDES e que
vinha sendo, de maneira incompreensível, sabotado pelo MMA.
Passados
6 meses, e arrefecida a empolgação inicial de quem achava (por absoluta
desinformação) que tinha pela frente um probleminha de fácil resolução, o CNAL
não só não ofereceu respostas como – surpresa! – retomou o atraente recurso da
campanha de conscientização.
Sob
certo grau de ingenuidade e ausência cabal de profissionalismo, os executivos
do CNAL acreditam que vão conseguir apagar o fogo na Amazônia e zerar o
desmatamento mediante a distribuição de cartilhas e panfletos, difusão de
propagandas no rádio e na televisão e, como não poderia faltar, divulgação de
muitos outdoors.
Mas
o exercício de ilusionismo não para por aí. Diante da dificuldade orçamentária
trazida pela crise sanitária – e também pela sabotagem do MMA ao Fundo Amazônia
–, a saída mágica ficou ainda mais execrável.
Todo
o material da campanha publicitária destinada a convencer/conscientizar/sensibilizar
o produtor será concebido e elaborado não por profissionais da publicidade, mas
pelos próprios servidores do Ibama e do ICMBio.
Sem
falar do nível de amadorismo que certamente permeará a produção desse material,
claro que, mais uma vez, será tudo inútil – e as campanhas levadas a efeito nos
últimos 30 anos estão aí para demonstrar que se esse tipo de medida resolvesse
alguma coisa, não conviveríamos na Amazônia com problemas ambientais que só se
agravam, ano após ano.
Nada
obstante, tudo indica que ao CNAL importa apenas responder com publicidade à
pressão que recebe por ações efetivas de combate ao desmatamento e às queimadas
– para as quais não demonstrou competência.
Enquanto
não houver consenso em torno das razões que levam o produtor rural na Amazônia
a desmatar e queimar não haverá luz no final dessa fumaceira.
Não
é por maldade, ou por falta de informação, ou ainda por não estar
sensibilizado, conscientizado ou convencido sobre os efeitos nefastos dessas
duas práticas, ou finalmente porque precisa saciar a fome de sua família – o
pequeno, o médio e o grande produtor na Amazônia desmatam e queimam para
investir na produção.
É
uma tomada de decisão de empreendedor que almeja aumentar seus ganhos,
ampliando seu plantel de gado – que, como ensinado pela assistência técnica que
recebe, cria de forma extensiva, num lugar em que a terra coberta por floresta
é mais barata do que a terra nua.
O
investimento desse produtor é amparado por crédito subsidiado, fornecido todos
os anos pelo FNO (Fundo Constitucional do Norte), por meio do Banco da Amazônia
– e com fartura, de modo a atender à demanda por dinheiro dos criadores de gado
na região.
Afinal,
para o Basa e o FNO, criar boi é a melhor alternativa econômica para a
Amazônia. É a eles que o CNAL deveria direcionar sua campanha, e não ao
produtor.
*Professor
Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro florestal, especialista
em Manejo Florestal e mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do
Paraná, e doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.
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