domingo, 9 de fevereiro de 2014

Universidades federais não entendem o Sisu
* Ecio Rodrigues
Envolvidas na esquematização de regras para a diferenciação dos cotistas, que somados alcançam a expressiva e preocupante cifra de 50% das vagas oferecidas, as universidades federais que aderiram ao Sisu não conseguem entender o funcionamento do sistema e perdem de vista seu principal objetivo: evitar a sobra de vagas.

Um dilema antigo esse. Por um lado, a quantidade de vagas ofertadas pelas universidades federais é inexpressiva diante da gigantesca procura, não chegando, possivelmente, a 10% da demanda (faltam as estatísticas do Inep para um número mais confiável); por outro, essa quantidade de vagas não é totalmente preenchida, o que onera sensivelmente o ensino superior público e gratuito.

As razões para a sobra de vagas ou para a existência de vagas ociosas – quando há uma demanda assustadora pelo ensino gratuito e de boa qualidade ofertado pelas universidades federais – são diversas, mas podem ser agrupadas em um único item: dificuldade crônica de gerenciamento.

A superação desse obstáculo recorrente da ausência de capacidade administrativa, no que se refere à eliminação das vagas ociosas, foi o que levou o Ministério da Educação a transformar o Exame Nacional de Ensino Médio, o Enem, no principal instrumento para a obtenção de uma vaga nas universidades federais e a investir na criação de um sistema informatizado, a fim de possibilitar ao aluno a escolha do curso e da universidade, de acordo com a sua nota no Enem.

Por meio desse sistema, o chamado Sisu, a demanda e a oferta seriam unificadas, de forma a evitar-se a ocorrência de vagas ociosas nas universidades federais. Essa era a ideia.

O Sisu se mostrou eficiente, e o Enem vem se consolidando como instrumento efetivo de seleção dos alunos, encerrando o longo ciclo dos vestibulares (que não deixou saudades), quando praticamente cada uma das 56 universidades federais realizava seu próprio concurso anual, sob um custo inadmissível para o país.

A despeito disso, contudo, as mesmas vagas ociosas continuam ociosas, ou aumentaram de quantidade, ou, o que é bem pior, são preenchidas por processos de seleção questionáveis, que ocorrem por fora do sistema Enem/Sisu.

Para esclarecer melhor: o Sisu funciona com duas chamadas, nas quais os candidatos escolhem o curso e a universidade, com a obrigação de comparecer para efetivar a matrícula. Se o candidato não comparece à matricula, uma nova chamada é publicada, para preenchimento das vagas dos faltosos. Se continuarem sobrando vagas, cada universidade segue convocando os inscritos em sua respectiva lista de espera. A lista de espera é composta pelos candidatos que não alcançaram as notas de corte na primeira e na segunda chamada.

As universidades possuem a obrigação de realizar quantas chamadas forem necessárias para completar a oferta de vagas. Todavia, como o procedimento entre a publicação da lista dos convocados para matrícula e o encerramento do prazo de matrícula leva em média 15 dias, geralmente as universidades só conseguem chegar a umas 10 chamadas, antes do início do semestre. A partir daí, a vaga continuará ociosa.

Há ainda um outro problema. Ocorre de o candidato garantir sua vaga com a matrícula, mas não comparecer para fazer o curso. É Provável que ele fique esperando o resultado de outra universidade ou que pretenda tentar novamente o Sisu.

Esse conjunto de vagas que sobram mesmo depois que o aluno faz a matrícula (já que ele não faz o curso), e que as universidades chamam de “vagas residuais”, costumam ser preenchidas da pior forma: sem processo de seleção, ou sob seleção precária. Com o Sisu, a quantidade de vagas residuais cresceu de forma assustadora.

Encontrar soluções para o aprimoramento do sistema Enem/Sisu: essa meta deveria mobilizar o MEC e as universidades, mas, infelizmente não é o que acontece. 
           

* Professor da Universidade Federal do Acre (Ufac), Engenheiro Florestal, Especialista em Manejo Florestal e Mestre em Economia e Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) e Doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília (UnB).

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

Em defesa da Resolução 457 do Conama
* Ecio Rodrigues
No final de 2013, ano em que os ideais de sustentabilidade ficaram mais difíceis de ser alcançados na Amazônia (sobretudo em face da ampliação da taxa de desmatamento), entrou em vigor, depois de cumprido o prazo preparatório, a Resolução 457, do Conama, que regulamenta a Lei 9.605/98 no que se refere ao espinhoso tema da destinação e guarda dos animais silvestres apreendidos pela fiscalização estatal.

A aprovação dessa resolução e sua efetiva vigência deveria ser algo a ser comemorado, mas não foi o que aconteceu. As dez organizações da sociedade civil que representam, perante o Conama, o movimento ambientalista das cinco regiões geográficas do país se viram encurraladas diante das equivocadas críticas que lhes foram disparadas. E aí, duas constatações podem ser feitas.

A primeira diz respeito à costumeira ausência de disciplina democrática tupiniquim, já que parece normal pôr em dúvida deliberações aprovadas por colegiados eleitos para tal fim. Vale dizer, é preferível optar pelo simplório caminho do questionamento da legitimidade dos representantes eleitos, do que se envolver nas discussões que culminam na aprovação ou rejeição das propostas.

Já a segunda constatação diz respeito à dificuldade que temos, que deve ser mesmo cultural, em avaliar um quesito crucial às normas – sua exequibilidade. É que a Resolução 457 tenta fornecer alguma condição operacional à Lei 9.605/98, norma que se mostrou, ao ser confrontada com apontadores e estatísticas, mais um daqueles casos de mandamento inexequível e ineficiente.
Para entender melhor: em fevereiro de 1998, os ambientalistas festejaram o advento de uma legislação rigorosa (considerada uma das mais severas do mundo), dispondo sobre a punição de infrações ambientais. A expectativa era a de que a Lei 9.605/98 seria uma verdadeira panaceia, o remédio para a cura de todos os males na área ambiental

Em seu artigo 25, a legislação que criminalizou quase tudo estabeleceu que os animais silvestres apreendidos em ações de fiscalização deveriam ser “libertados em seu habitat ou entregues a jardins zoológicos, fundações ou entidades assemelhadas, desde que fiquem sob a responsabilidade de técnicos habilitados”.

Como são raros os casos em que zoológicos se dispõem a aceitar tal incumbência, e como as ditas “entidades assemelhadas” simplesmente não existem (ainda mais contando com os serviços do aludido profissional habilitado), a única saída passou a ser a devolução do animal ao meio ambiente – algo igualmente complexo, que deixava os policiais e bombeiros sem saber como proceder. Assim, uma longa fila de espera acabou se formando, e os bichos confiscados se transformaram num grande transtorno.

Passaram-se quase 15 anos sem que se atentasse para o óbvio: esse tipo de destinação não estava dando certo. O resultado, outra vez óbvio, é que os objetivos da norma, ou seja, a salvaguarda dos animais, estavam longe de ser cumpridos.

Foi nesse mato sem cachorro (com o perdão do trocadilho) que o Conama teve a ousadia de intervir, reconhecendo que, num país onde faltam hospitais, a edificação de centros de tratamento para animais silvestres apreendidos, como reivindicam os ambientalistas ortodoxos, não poderia ser uma prioridade. Assim, após um longo período de estudos e debates em torno da questão, foi aprovada a Resolução 457, que permite que particulares interessados se habilitem para a adoção dos animais apreendidos.

A normativa, é certo, não irá resolver o problema, mas possibilitara que novos procedimentos sejam testados e avaliados no futuro. Ainda está contaminada por precauções inúteis e exageros burocráticos que deverão vir a ser eliminados, como a exigência de Anotação de Responsabilidade Técnica, a questionável ART, que não serve para muita coisa, mas atrapalha bastante.

A fauna silvestre, em especial a amazônica, é tratada pelas normas sob alto grau de insensatez. Bom senso, esse o principal mérito da Resolução 457.

* Professor da Universidade Federal do Acre (Ufac), Engenheiro Florestal, Especialista em Manejo Florestal e Mestre em Economia e Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) e Doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília (UnB).


Livro Ciliar Só Rio Acre

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