Participação
popular não garantiu o zoneamento na Amazônia
* Ecio Rodrigues
O período
que vai de 1992 (quando foi realizada a Conferência da ONU no Rio de Janeiro) a
2007 (quando foi aprovada, no Acre, uma das últimas leis estaduais de
zoneamento) poderia ser designado como “Era do Zoneamento” na Amazônia.
Nesse
intervalo, praticamente todos os estados amazônicos gastaram muito dinheiro
público na realização de Zoneamento Ecológico-Econômico, ZEE, com o objetivo de
organizar a ocupação produtiva em seus territórios.
Imaginava-se
que, por meio de estudos técnicos, seria possível zonear a superfície rural e determinar
a vocação produtiva de cada zona.
Essa
vocação técnica, por sua vez, seria confrontada com a demanda da sociedade –
entendendo-se a participação da população na definição do uso da terra como
peça-chave para o sucesso do zoneamento.
Todavia,
nada disso se concretizou. E, por sinal, hoje existe grande questionamento em
relação ao papel da participação popular em planejamentos de políticas públicas,
em especial na elaboração de zoneamentos.
Ora,
em primeiro lugar, parece pouco provável que a população em geral esteja preparada
para discutir e decidir um assunto eminentemente técnico como é o caso da
vocação de uso do solo. Cabe ressaltar que, tratando-se da Amazônia, as duas opções
“populares” são a pecuária de gado e a agricultura de queimada para produção de
arroz, feijão, milho e macaxeira.
Por
outro lado, não é exagero dizer que, no Brasil, a gestão pública não consegue
seguir um planejamento de 2 anos – quanto mais de 20 anos, como se propugnava
no ZEE.
No frigir
dos ovos, a área de floresta destinada à criação de boi foi ampliada em toda a
Amazônia. Esse é o saldo do ZEE.
Depositar
as expectativas na decisão do produtor não foi o melhor caminho para frear a
consolidação da pecuária. A saída parece estar na redução dos impactos
ambientais resultantes das atividades produtivas.
Mas,
como levar a ação governamental a se voltar para esse fim?
Acontece
que há grande discrepância entre o planejado e as decisões políticas, sobretudo
quando, no primeiro caso, as evidências científicas (dados estatísticos e
séries históricas) são a base das decisões e, no segundo caso, o populismo
eleitoral impregna o cotidiano dos órgãos públicos.
No
âmbito do saneamento básico e recursos hídricos, por exemplo, houve, nos
últimos 25 anos, um investimento considerável da sociedade brasileira no
planejamento de ações estatais, de forma a reverter o grave quadro de
deficiência que até hoje caracteriza o setor.
Sem
embargo, os políticos – e os gestores públicos por eles nomeados – não atentam
para o fato de que obedecer ao planejado é um imperativo da democracia.
A
desconexão entre a técnica e a política é deveras preocupante, e, como demonstra
a experiência com a elaboração de ZEEs nos estados amazônicos, a participação
popular não é a solução.
Sem
que se resolva essa discrepância, continuar-se-á a gastar dinheiro com
planejamentos que não vão a lugar nenhum – mas poucos parecem interessados nisso.
*Professor
Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro florestal, especialista
em Manejo Florestal e mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do
Paraná, e doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.