* Ecio Rodrigues
A ONU proclamou a década que começa em 2021
como “Década da Restauração de Ecossistemas”. O objetivo é frear a degradação e
até 2030 restaurar um bilhão de hectares de ecossistemas nativos em todo o
mundo.
Embora ambiciosa, a meta é bastante
factível.
Acontece que os projetos de restauração
de ecossistemas em geral – e da biodiversidade florestal, em particular – por sua
própria natureza, promovem a distribuição de renda e estimulam a economia
local.
Para explicar melhor, cite-se, a título
de exemplo, um município do Acre – Porto Valter, digamos, onde a economia não
avança desde sempre, restringindo-se a uma produção agrícola sem condição
logística de expansão, nem hoje nem no futuro.
Agora, vamos supor que a criação
extensiva de gado, predominante na região, tenha deixado um rastro de
destruição de mais de 1.000 hectares de florestas, o que é mais do que plausível.
O projeto de restauração florestal vai
envolver o mesmo tipo de trabalho rural exigido na agricultura para procedimentos
como preparação do solo, coleta de sementes, produção de mudas, plantio,
cercamento e replantio anual.
Ou seja, no fim das contas, a dinâmica
econômica criada e mantida pelo projeto de restauração oferece opção de emprego
e renda para trabalhadores experimentados basicamente nessas mesmas atividades
rurais.
Por outro lado, é inconteste que negociações
internacionais requerem consenso e produzem acordos que, uma vez aprovados
pelos países, devem ser rigorosamente obedecidos.
Assim, os governos nacionais – pouco
importando se foram eleitos antes ou depois da oficialização do ajuste – são compelidos
a cumprir as obrigações convencionadas, sob pena de pôr em risco a reputação
internacional do país e sua credibilidade para celebrar tratados e contratos comerciais
demandados pela sociedade.
É aí que entra o Acordo de Paris, pacto
assinado em 2015, em cujo âmbito o Brasil se comprometeu a restaurar 12 milhões
de hectares de florestas especiais, como é o caso da mata ciliar.
Para alcançar essa ousada cifra, o país
definiu uma base legal, de modo a fornecer segurança jurídica aos investimentos
em restauração florestal na Amazônia.
Como se sabe, o Código Florestal estabelece a largura mínima da faixa
de vegetação a ser mantida ao longo dos rios, igarapés e nascentes, e estipula as
regras para a restauração da mata ciliar – na qual só podem ser empregadas
árvores nativas e endêmicas da própria mata ciliar.
As disposições do código concernentes à
matéria foram regulamentadas pelo Decreto 8.972/2017, que, por sua vez, introduziu
a Proveg (Política Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa).
A Proveg fomenta a instalação de
empreendimentos destinados à produção de sementes, mudas etc., e que devem surgir
em decorrência da execução dos planos estaduais de restauração florestal.
Esses planos estaduais integrarão o
Plano Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa, ou Planaveg, e poderão
acessar os recursos financeiros a serem disponibilizados pela política.
Enfim, além de se direcionar ao crucial
escopo de estancar a expansão da pecuária extensiva sobre as áreas de florestas
– em especial diante da preocupante tendência de elevação da taxa de
desmatamento que vem se evidenciando desde 2013 –, a Década da ONU de
Restauração de Ecossistemas também configura poderoso instrumento para impulsionar
a economia de baixo carbono na Amazônia.
Dessa forma, o momento é mais que oportuno
para o Serviço Florestal Brasileiro, valendo-se de sua equipe técnica e com o
apoio da diplomacia brasileira, buscar, junto à cooperação internacional, os
recursos necessários para consumar a restauração florestal na região.
Como dizemos os que se preocupam com o
futuro da Amazônia, é chegada a hora da floresta comer pasto!
*Professor
Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro florestal, especialista
em Manejo Florestal e mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do
Paraná, e doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.