* Ecio Rodrigues
Em
janeiro último, depois de mais de 15 anos de discussões, finalmente foi editada
legislação dispondo sobre a possibilidade de precificação de ativos ambientais.
Trata-se da Lei 14.119, publicada em 13/01/2021, e que instituiu a “Política
Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais”, ou simplesmente PNPSA.
A despeito
de sua aprovação, contudo, a norma retornou ao Congresso para nova apreciação especificamente
quanto às partes vetadas – o que foi concluído agora, no final de março, tendo
sido derrubada a maioria dos vetos impostos por ocasião da sanção presidencial.
Sem
entrar no mérito do conteúdo desses dispositivos vetados e posteriormente
promulgados, ou da divergência que levou à queda de braço entre Presidência e Parlamento,
o importante é que, uma vez ultimado o processo legislativo, a lei passou a
vigorar plenamente, e a PNPSA pode enfim começar a ser implementada.
A PNPSA é
fruto do esforço de entidades do terceiro setor e de organizações ligadas ao agronegócio,
e ainda que tenha recebido pouca ou nenhuma atenção por parte da imprensa, o
seu advento decerto representa um marco, um divisor de águas no contexto da
política ambiental do país.
Para explicar
melhor, cite-se o caso das normas de licenciamento ambiental que vigoram em
todo o território nacional. Ao construir uma rodovia ou uma hidrelétrica (duas das
obras mais caras na realidade amazônica), uma empresa deve cumprir um conjunto
de condicionantes a fim de obter, do órgão público licenciador, a licença de
operação – o estágio final do procedimento, que vai permitir que o
empreendimento, como a própria designação da licença indica, comece a operar.
Atestar o
cumprimento ou não, pela empresa, dos requisitos que lhe foram exigidos é atribuição
de um órgão de controle ambiental. Por meio de fiscalização, autuação, cominação
de penalidades – ou seja, fazendo uso dos chamados instrumentos de comando e controle
–, o Estado fixa obrigações, cujo descumprimento
acarreta sanções de cunho administrativo e até mesmo penal.
Acontece
que esse padrão de ação pública ancorado no comando e controle foi levado do
âmbito do licenciamento a outras áreas, tais como unidades de conservação; uso
dos recursos hídricos; exploração da biodiversidade florestal; controle do
desmatamento na Amazônia – áreas essas para as quais está longe de ser o modelo
mais adequado para se alcançar com êxito os objetivos preconizados pela Política
Nacional de Meio Ambiente.
Por
sinal, de uma rápida análise da série histórica das taxas anuais de
desmatamento é fácil perceber que a estratégia de usar os instrumentos do comando
e controle para barrar a destruição florestal não tem dado muito certo – para
dizer o mínimo. Embora venha cada vez mais se intensificando, a verdade é que o
aparato de fiscalização não chega nem perto de apresentar resultados que
justifiquem os altos custos que inflige à sociedade.
Diferentemente
da abordagem imposta pelo comando e controle, os mecanismos relacionados ao PSA
se baseiam no princípio do poluidor pagador e valorizam – ou precificam, como
preferem os economistas – determinada quantidade de bens ou serviços, cujos
atributos ambientais permitem minimizar os impactos decorrentes de atividades
potencialmente poluidoras.
Assim, os
produtores, por exemplo, que têm suas propriedades cortadas por um rio que, por
sua vez, abastece uma cidade a jusante podem ser remunerados para manejar a floresta
existente na mata ciliar e, dessa maneira, prestar o serviço de melhorar a
quantidade e a qualidade da água fornecida.
Ou,
ainda, produtores que dispõem de áreas de florestas podem ser pagos para
manejá-las, no intuito de potencializar a quantidade de carbono retirada da
atmosfera e incorporada à biomassa, de forma a reduzir o aquecimento do planeta
e o risco de mudanças climáticas.
Algumas
experiências alusivas a PSA/água e PSA/carbono já vinham sendo realizadas na
Amazônia, todavia sem contar com uma política nacional que fornecesse segurança
jurídica ao fluxo financeiro (quando o dinheiro passa do poluidor pagador para
o produtor).
Com a
PNPSA, a conservação dos ativos presentes na biodiversidade florestal da
Amazônia terá preço e, o melhor, será atrativa para o mercado.
*Professor
Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro florestal, especialista
em Manejo Florestal e mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do
Paraná, e doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.
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