* Ecio Rodrigues
Poucos reconhecem que a tecnologia de manejo florestal comunitário
foi concebida e detalhada pelos engenheiros florestais do Acre e, o principal,
que o propósito foi levar a exploração de madeira até as colocações dos
seringueiros.
O desenvolvimento da tecnologia, bem como a escolha da madeira como
produto prioritário e a demarcação da unidade produtiva do extrativista (a dita
“colocação”, situada no interior do ecossistema florestal), na condição de referência,
foram decisões motivadas pela criação dos primeiros Projetos de Assentamentos
Extrativistas, PAE.
Instituídos e geridos pelo Incra em 1988, os 3 primeiros PAEs foram
criados no Acre (Cachoeira, Porto Dias e São Luís do Remanso), para o
assentamento dos próprios extrativistas que já residiam naqueles seringais, requerendo
o desenvolvimento de uma alternativa produtiva que possibilitasse gerar renda
sem derrubar a floresta.
Estava, por óbvio, na exploração comercial e sustentável da
biodiversidade florestal a saída econômica para as áreas de florestas ocupadas
por pequenos produtores – que logo ganhariam expressão nacional com o apoio do
movimento ambientalista ao modelo das reservas extrativistas.
As reservas extrativistas surgiram no rastro dos PAEs (mas sob a
jurisdição do Ministério do Meio Ambiente), destinando-se especificamente a garantir,
por um lado, a regularização fundiária das posses remanescentes nos antigos
seringais e, por outro, a viabilização da produção florestal no perímetro da
resex, como forma de combater o desmatamento da floresta na Amazônia.
Todavia, naquela época, início da década de 1990, o entendimento de
que era indispensável a concepção de uma tecnologia que facultasse a produção
sustentável de madeira pelos produtores residentes em PAEs e reservas
extrativistas, no intuito de lhes assegurar renda superior à gerada com a criação
extensiva de boi, não era perfilhado pelos analistas do Ibama e nem mesmo por parcela
expressiva dos engenheiros florestais.
Entre os motivos que levaram os produtores, por meio de suas
entidades representativas, a apostar, mesmo sob elevado risco econômico, na
aplicação da tecnologia do manejo florestal comunitário para produção de
madeira, podem-se citar:
a) o elevado impacto social, decorrente
do padrão de ocupação baseado na expansão do desmatamento, provocado sobre as
comunidades extrativistas que habitavam a floresta;
b) a redemocratização do país e
o consequente processo de mobilização e organização da sociedade civil na
Amazônia;
c) a imprescindível e
determinante oferta de recurso financeiro a fundo perdido, oriunda da cooperação
internacional e destinada exclusivamente ao apoio às comunidades para o manejo
das florestas.
Ocorre que a aquisição de terras, por parte de pecuaristas
sulistas, na Amazônia e no Acre, em particular, foi intensificada na década de
1970, excluindo do sistema produtivo o extrativista, que teria como destino os
programas de reforma agrária.
Com sua condição econômica debilitada pelos baixos preços da
borracha e sofrendo as nefastas consequências do desmatamento, as comunidades extrativistas
passaram a se organizar em busca de alternativas produtivas.
Surgiram associações, sindicatos, cooperativas, centrais de
produção etc., processo que culminou com a criação do Conselho Nacional dos
Seringueiros em 1985.
Organizações não governamentais apoiaram os extrativistas na
complicada relação com o Estado e nos complexos procedimentos de obtenção de
financiamento para projetos de alto risco. Por fim, a oferta de recurso
financeiro a fundo perdido se mostrou pequena frente ao crescimento exponencial
da demanda dos produtores.
Em função de sua característica de inovação, a tecnologia do
manejo comunitário teve que superar empecilhos normativos, mercadológicos,
culturais e institucionais – exigindo disposição pra tanto.
Atividades produtivas no meio florestal são excludentes entre si.
O produtor vai se dedicar ao manejo comunitário da biodiversidade florestal,
desde que essa atividade lhe proporcione os mesmos níveis de renda fornecidos
pela pecuária extensiva de gado.
Ou seja, para zerar o desmatamento, a biodiversidade florestal da
Amazônia deve gerar os ganhos que o produtor auferiria se criasse bois soltos
no pasto.
*Professor
Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro florestal, especialista
em Manejo Florestal e mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do
Paraná, e doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.
Nenhum comentário:
Postar um comentário