Ecologistas, economistas e a Amazônia
* Ecio Rodrigues
A partir do seu surgimento, a ecologia começou
a pôr em xeque alguns pressupostos que embasam as análises econômicas e
sociológicas em torno da realidade rural amazônica.
Pelo
lado da ciência econômica, os ecólogos contestam os prognósticos acerca da
relação homem x natureza, que,
sempre escudados no conceito “ceteris paribus”, não levam em conta os contextos
históricos, sociais e culturais nos quais estão inseridas as populações
tradicionais que habitam os ecossistemas da Amazônia.
Pelo
lado da sociologia, questiona-se a prioridade conferida, nas análises, à relação
pequeno produtor x grande
produtor, uma vez que os sociólogos não atentam para a diferença ecológica fundamental
entre o modo de produção extrativista, que aufere renda mediante a coleta de castanha
e outros produtos florestais, e o modo de produção pecuarista, cujos ganhos são
obtidos por meio da criação de gado.
Ou
seja, na visão da ecologia, o problema reside no que se produz – e não no
tamanho da propriedade.
Dessa
forma, ao adotar a criação de gado como opção primordial de investimento (o que
passou a ocorrer sobretudo a partir da última década do século passado), o
pequeno produtor se igualou ao grande, tornando-se ele também um empecilho (e ainda
mais complexo) para a sustentabilidade da Amazônia.
Resumindo,
para os ecologistas, zerar o desmatamento efetuado para o cultivo do capim que
vai alimentar o boi – seja na pequena, média ou na grande propriedade rural – é
a saída para a sustentabilidade da Amazônia e, por conseguinte, para o futuro
da região.
Voltando
aos economistas. Em vista da insuperável inelasticidade de oferta que
caracteriza a produção de borracha, castanha e demais produtos oriundos da
biodiversidade florestal (com exceção da madeira, obviamente), as análises
econômicas apontam a falência do modelo de ocupação produtiva baseado na
exploração dessa biodiversidade – e defendem que a saída para a Amazônia é a domesticação
pela agricultura e a substituição dos produtos florestais por sintéticos.
Contudo,
diante da complexa realidade amazônica, não é possível, como acertam os
ecologistas, concluir pela inviabilidade da exploração da biodiversidade florestal
mediante mera análise da produtividade – o que justificaria o desmatamento para
criar boi, desde que dezenas de outras variáveis não fossem equacionadas, ou fossem
mantidas constantes, como prevê a condição “ceteris paribus” da ciência
econômica.
Para
reforçar o argumento em defesa da exploração sustentável da biodiversidade
florestal, em detrimento do desmatamento para criação de boi, os ecologistas lançam
mão do robusto arsenal científico que se ocupa das externalidades econômicas
decorrentes do processo produtivo.
Acontece
que, ao considerar a produtividade por hectare a principal variável para o
investidor decidir o que fazer nas terras com florestas na Amazônia, os
economistas simplificam a análise e deixam de lado as externalidades
decorrentes tanto do desmatamento quanto da perda dos serviços prestados pelas
florestas.
Afinal,
existe um rol de variáveis que devem pesar na decisão de investimento dos
governos e da iniciativa privada na Amazônia, e que são desconsideradas pelos economistas.
A
avaliação de investimentos realizada pelos economistas deixa de prever, por
exemplo, a decisiva interferência da cooperação internacional, que limita os
investimentos destinados à ampliação do desmatamento ou que venham a
comprometer os destinos da maior floresta tropical do mundo.
De
outra banda, veja-se o caso dos recursos hídricos, que até bem pouco tempo eram
tidos como externalidades ambientais, e agora passaram a compor as planilhas de
custos dos empreendimentos a serem instalados na Amazônia.
Se
antes as florestas eram motivo de preocupação, adicione-se, após o Acordo de
Paris, a água e o ar, cuja escassez poderá pôr em risco a humanidade.
Floresta,
água e ar estão conectados, não dependem da inelasticidade da borracha ou do
tamanho da propriedade. Os ecologistas venceram.
*Professor
Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro florestal, especialista
em Manejo Florestal e mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do
Paraná, e doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.
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