Diferenciando o
preservacionismo do conservacionismo
* Ecio Rodrigues
Uma coisa é considerar a floresta amazônica um
santuário intocável, que deve ser protegido da presença humana – de toda e
qualquer presença humana, seja uma população indígena ou um explorador com motosserra
em punho.
Como defende o preservacionismo.
Outra coisa, bem diferente, é a defesa do
aproveitamento comercial da biodiversidade florestal amazônica, a fim de gerar
emprego e renda, todavia, assegurando-se a manutenção da floresta e o estoque de
produtos, que são explorados de maneira sustentável.
Como defende o conservacionismo.
Muitos estudiosos se esforçaram para demonstrar as
vantagens e riscos das duas principais correntes do ambientalismo – alguns com
extrema precisão, como é o caso do argentino Héctor Ricardo Leis (“A Modernidade
Insustentável”, ed. Vozes, 1999).
Para
Leis, o ambientalismo deve ser compreendido como movimento histórico – e essa qualificação
é essencial, por permitir distinguir o ponto de vista ambientalista do enfoque
técnico comum a grupos de interesse, bem como do comprometimento ideológico de
movimentos sociais.
Sendo
assim, continua o autor, na gênese do ambientalismo como movimento histórico
destaca-se a fase da estética, em que se molda a relação do homem com a
natureza, sendo esta considerada como objeto de domínio, e o homem, como aquele
que possui alma, criado para dominar esse mundo natural sem espírito.
A
estética ambientalista surge então “no século XIX, do encontro (fortuito?) da
preocupação dos naturalistas por conhecer melhor os ecossistemas com a
preocupação democrático-revolucionária (contextualizada historicamente pelas
revoluções do século XVIII nos Estados Unidos e na França) pelos direitos do
homem”.
Essa
fase estética – que é fortemente influenciada pelo ambientalismo americano –
tem como principal referência a segregação de áreas intocáveis, como o Parque de
Yellowstone (1872), que de certa forma veio glamorizar o ideal de vida selvagem,
exportado para outros países.
A
publicação do livro “Man and Nature”, pelo americano George Perkins Marsh, em
1824, foi decisiva para o alerta quanto à responsabilidade do homem em relação
à natureza. De espírito religioso, mas adotando critérios científicos, Marsh foi
pioneiro ao constatar que “[...] o homem esqueceu faz muito tempo que a terra
foi dada a ele somente em usufruto, não para consumo, e muito menos para
despejar lixo”.
Ainda
segundo Leis, no início do século XX a fase estética do ambientalismo foi superada,
em especial nos Estados Unidos, a partir dos intensos confrontos entre o
preservacionismo do naturalista John Muir e o conservacionismo do engenheiro florestal
Gifford Pinchot.
Na
visão do naturalista, o DNA do homem seria de destruidor – daí a necessidade de
segregar ambientes naturais abertos somente à visitação e pesquisa, designados
como parques nacionais.
De
outra banda, o engenheiro era eloquente defensor da exploração sustentável, ou
uso racional – nos primórdios do que atualmente se conhece por desenvolvimento
sustentável.
O
envolvimento dos cientistas, conforme explica Leis, ocorreu com mais vigor na
década de 1960. Nessa fase do ambientalismo é visível a participação dos pesquisadores,
sobretudo com a publicação dos estudos alarmistas que previam a ocorrência de explosão
demográfica em âmbito mundial, com as consequentes limitações à satisfação das
demandas das futuras gerações.
Finalizando,
Leis destaca o surgimento, a partir da década de 1960, do ator social mais importante
do ambientalismo: a organização não governamental, ou ONG. Nos vinte anos
seguintes, as ONGs se consolidariam em todo o planeta.
Aos
que não conseguem compreender a importância social das ONGs para o
amadurecimento da democracia, vale prestar atenção às palavras de Leis:
“[...] a intervenção
da sociedade civil mundial (por meio das
ONGs) nos problemas ambientais representa muito mais que uma simples ação
dirigida a corrigir efeitos deletérios do mercado e dos Estados (e Governos). Ela deve ser vista em dois
planos: como a condução de vínculos globais entre realidades locais (aspecto
transnacional) mas também como a construção (ou reconstrução) estratégica de
vínculos entre as dimensões biofísica, cultural e política da humanidade”.
*Professor
Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro florestal, especialista
em Manejo Florestal e mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do
Paraná, e doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de
Brasília.
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