terça-feira, 24 de setembro de 2019



ONGs ajudam a reduzir queimadas na Amazônia, governos nem sempre
* Ecio Rodrigues
Na Amazônia, existe relação direta entre eleições e aumento do desmatamento e das queimadas. Durante o período eleitoral, a taxa de desmatamento sobe e as queimadas se acentuam – em especial quando as eleições são municipais, como as que vão acontecer em 2020.
As razões são, até certo ponto, óbvias. Não se vê, na região, candidato a prefeito ou a governador com potencial eleitoral que não se posicione favoravelmente à ampliação da produção rural, sob o pretexto de melhorar a qualidade de vida do produtor e a dinâmica local da economia.
Veja bem, esses políticos não apoiam, de forma objetiva, a produção de commodities agrícolas em larga escala, quer dizer, o agronegócio exportador – atividade que, por mais inusitado que pareça, pouco tem a ver com o desmatamento e a queimada atualmente praticados na Amazônia.
Trata-se, enfim, da defesa da pecuária extensiva e do agricultor familiar.
O voto desse produtor, como se sabe, é incerto, e o candidato que dele depende quase sempre fracassa. Todavia, é fato que, a despeito do duvidoso retorno eleitoral, o agricultor familiar conta com o apoio incondicional de todos os candidatos ao Executivo e ao Legislativo, em âmbito municipal e estadual. 
O paradoxo consiste no seguinte: ao externar seu respaldo à agricultura familiar, o candidato busca, em verdade, o voto do eleitor urbano, que pouco entende de produção rural e, o pior, não relaciona o apoio à agricultura familiar ao aumento das queimadas – uma prática que ele abomina porque aflige sobretudo quem mora na cidade.
Mas esse eleitor enxerga a tal agricultura familiar sob um olhar romântico. Não percebe que os pequenos e médios produtores se dedicam prioritariamente à criação de gado e, por conseguinte, são hoje os maiores responsáveis pelo aumento do desmatamento e das queimadas.
Esse contexto político não é de agora – persiste há mais de 3 décadas. Os governos estaduais e municipais se revezam, desde o final da década de 1980, quando retornaram as eleições diretas, nesse eterno paradoxo, conferindo incentivo eleitoreiro ao aumento da produção agropecuária, ao mesmo tempo que defendem o controle do desmatamento e das queimadas.
No frigir dos ovos, diante da paralisia decisória dos governantes, as ONGs surgiram como agentes prioritários de execução de projetos dedicados à conscientização e qualificação do produtor na aplicação de práticas alternativas, que inibem o desmatamento e prescindem das queimadas.
Não à toa, parte considerável dos recursos oriundos da cooperação internacional, doados pelos países que se preocupam com a conservação da floresta na Amazônia, é destinada a programas desenvolvidos por ONGs.
Talvez o melhor exemplo disso esteja exatamente no Fundo Amazônia, que o governo, por incompetência sem precedentes, insiste em sabotar.
Parcela vultosa do dinheiro ofertado por Noruega e Alemanha custeou ações voltadas para reduzir as extensões de floresta que anualmente são desmatadas e queimadas na Amazônia.
Diante de sua importante atuação, as ONGs gozam de reconhecimento mundial, obtendo suporte financeiro de fontes diversas e variadas. 
Além de agências ecumênicas, fundações de empresas multinacionais etc., também as sociedades de alguns países se incluem entre esses financiadores.
Esse é o caso da sociedade brasileira, que, notadamente por meio do orçamento da União, sempre apoiou o trabalho levado a cabo pelas ONGs na Amazônia.
Agora, ao que tudo indica, isso pode mudar.

*Professor Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro florestal, especialista em Manejo Florestal e mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná, e doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.


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