terça-feira, 22 de dezembro de 2020

652 km² de florestas destruídas no Acre em 2020

 

* Ecio Rodrigues

Entre agosto/2018 e julho/2019 foram desmatados 682 km² de florestas no Acre. Foi a maior área devastada desde 2004 – a despeito da tendência de alta observada a partir de 2013.

Com a divulgação da taxa de 2020, constata-se que o desmatamento manteve a mesma intensidade do ano passado, tendo atingido 652 km² de florestas. Considerando o período abrangido pela medição (agosto/2019 a julho/2020), integralmente sob a responsabilidade do atual governo, é possível concluir que a conservação da biodiversidade florestal permanece sem ser prioridade no Acre.

O fato de os índices de devastação retrocederem aos níveis da década passada, que se supunham superados, acende o alerta. Além de representar atraso inadmissível na política pública de meio ambiente, há o risco imediato de ocorrência de uma taxa de desmatamento de 4 dígitos. Sem falar da descrença da sociedade em relação ao futuro das florestas.

Não se pode esquecer que em 2003 o Acre superou a barreira dos 1.000 km² de destruição florestal. Para conter a tendência de alta e lograr rebaixar a taxa de desmatamento foram consumidos expressivos recursos na criação de aparato fiscalizatório. Todavia, e como apontam as evidências, o efeito trazido pela fiscalização é de curto prazo.

Existe farta evidência técnica, de outra banda, no sentido de que o agronegócio depende do desmatamento para se viabilizar. Talvez reconhecer essa dependência seja o primeiro passo, como informam os guias de autoajuda, para iniciar uma discussão aprofundada e, a partir daí, quem sabe chegar a uma solução.

Dessa forma, e assumindo que o agronegócio é, atualmente, prioridade para a economia do Acre e que mais de 80% da área ocupada por essa atividade produtiva é destinada à criação extensiva de gado – um empreendimento, diga-se, que fornece retorno questionável à sociedade –, facilmente se deduz que porção considerável  florestas será substituída por pasto nos próximos anos.

Ora, há que se convir que se trata de um cenário desolador, que pode fazer surgir uma geração de acreanos “sem-sem” – para usar um jargão caro aos demógrafos.

Sem emprego no presente, sobrevivendo numa economia estagnada, e também sem poder contar com a biodiversidade florestal, principal recurso estratégico do estado e garantia para as gerações futuras.

Para explicar. Se a economia continuar a depender da criação extensiva de gado, não haverá saída, ou mudança para melhor. A estagnação econômica permanecerá, e de igual modo continuará a pressão pela conversão da floresta em pasto, a fim de atender à demanda da pecuária por novas terras.

Continuaremos, por um lado, a depredar a valiosa biodiversidade florestal e, por outro, sem gerar riqueza suficiente para fortalecer a economia do estado e oferecer opção de emprego e renda aos acreanos.

Por muito tempo acreditou-se – e ainda há quem acredite – que os governos poderiam conter o desmatamento promovendo a ampliação da produtividade da pecuária (a fim de aumentar a quantidade de cabeças de gado por hectare). Significa afirmar, em outras palavras, que o fomento à pecuária inibiria a devastação florestal.

Mas a persistência de elevadas taxas de desmatamento demonstrou a insensatez dessa tese.

Na verdade, a raiz do problema é econômica. Mesmo que se estimule o desmatamento legalizado, o que não deixa de ser paradoxal, e se penalize o ilegal, que ninguém sabe direito onde ocorre, enquanto a pecuária extensiva se mostrar mais lucrativa para o produtor e, pior, para o Basa, que fornece financiamento com crédito subsidiado para a criação de gado, não haverá resposta.

Fazer a biodiversidade florestal gerar mais rendimentos que os ganhos de curto prazo trazidos pelo boi criado solto em 2 hectares de pasto é a única e providencial saída para cançar o desmatamento zero no Acre. Por mais que pareça utópico, não existe plano B, e o tempo urge.

O negócio da biodiversidade florestal no Acre precisa ser viabilizado, e já!

 

*Professor Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro florestal, especialista em Manejo Florestal e mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná, e doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.

 

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