segunda-feira, 3 de agosto de 2020

Produtores de reserva extrativista vão receber para não desmatar



* Por Ecio Rodrigues

Acordo inédito firmado entre a associação de produtores da Reserva Extrativista do Rio Cautário e a empresa de investimentos em conservação florestal Permian Global vai lograr alcançar o que, para muitos, é impossível: zerar o desmatamento.

Localizada em Rondônia, na fronteira com a Bolívia, essa unidade de conservação estadual se estende sobre o território dos municípios de Costa Marques e Guajará-mirim, integrando, juntamente com mais de 50 áreas protegidas, o Corredor Ecológico Binacional Iténez-Guaporé.

Como ocorre em praticamente todas as reservas extrativistas da Amazônia, a Resex do Rio Cautário sofre pressão do desmatamento – tanto de fora para dentro da reserva quanto, o mais preocupante, de dentro para fora.

Essa distinção entre as dinâmicas assumidas pelo desmatamento é fundamental, pois as medidas de combate são diferenciadas.

Para proteger a reserva extrativista da destruição florestal que ocorre fora dela é necessário o cumprimento de ações de fiscalização, seja por parte do órgão ambiental federal, Ibama, seja por parte do respectivo órgão ambiental estadual.

Por outro lado, o combate ao desmatamento que ocorre dentro do perímetro da reserva configura desafio de complexa superação. Pode-se dizer que inexiste experiência positiva nesse sentido na Amazônia.

Inexistia. Certamente a iniciativa da resex do Rio Cautário vai alterar essa realidade.

O ajuste foi efetuado por meio do mecanismo denominado REDD -­ Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação. Trata-se de um programa global, instituído em 1997 no âmbito do Protocolo de Quioto, que pressupõe a remuneração do produtor para o manejo de áreas de florestas, com o objetivo de prestar o serviço ambiental de retirada de carbono da atmosfera e assim contribuir para reduzir a temperatura do planeta.

O REDD possibilita que os países contabilizem o carbono imobilizado em seus territórios na forma de biomassa florestal (leia-se: florestas), para efeito de alcançar as metas estabelecidas perante o Acordo de Paris, tratado assinado em 2015 e considerado o mais abrangente pacto internacional destinado à mitigação dos efeitos das mudanças climáticas.

O arranjo financeiro para destinar ao produtor o dinheiro pago por uma empresa na obtenção de créditos de carbono, a fim de garantir conservação da área de floresta que vai mitigar os efeitos daquela produção industrial, sempre foi o calcanhar de Aquiles para a consolidação do REDD.

O contrato celebrado entre os produtores da resex do Rio Cautário e a empresa Global Prime preenche com muita simplicidade essa lacuna que parecia insuperável.

Cada família irá receber o equivalente a R$ 1.000,00 por mês, ou R$ 12.000,00 por ano, para manejar uma área de floresta sob sua custódia.

Nem vai desmatar, nem vai permitir que invasores desmatem sua floresta.

Botar o dinheiro diretamente na mão do produtor é o grande diferencial do contrato com a Global Prime. Algo que nunca aconteceu, por exemplo, nas experiências com o REDD no Acre, um dos estados pioneiros nesse tipo de iniciativa, mas que acumula uma extensa lista de fracassos.

Com duração de 30 anos, o contrato também prevê o investimento de R$ 5.592.000,00 por ano na execução do plano de manejo da resex. Significa que, além do pagamento individualizado às famílias, todos terão apoio, de forma coletiva, para manejar a floresta e produzir castanha, cipós, copaíba e outros produtos da floresta.

É o capitalismo, estúpido!, resolvendo o que antes era improvável: zerar o desmatamento na Amazônia – o ilegal e o legalizado.

 

*Professor Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro florestal, especialista em Manejo Florestal e mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná, e doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.

 


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