segunda-feira, 27 de maio de 2019



Condenar o Fundo Amazônia é estupidez: governo sabotando o governo
* Ecio Rodrigues
Vai ser muito difícil de explicar, no futuro, que o governo federal, por meio do Ministério do Meio Ambiente, MMA, cometeu o desatino de tentar desacreditar o Fundo Amazônia – o principal mecanismo público para captação de recursos internacionais destinados ao controle do desmatamento na Amazônia.
Trata-se de uma situação em que o governo sabota a si próprio; e, nesse caso em particular, pelo menos duas constatações são inevitáveis. Primeiro, que o governo se opõe à prioridade embutida nas doações internacionais recebidas pelo fundo: monitorar e, com sorte, zerar o desmatamento na Amazônia.
Segundo, que o governo desaprova a participação das organizações da sociedade civil no investimento dos recursos financeiros – o que evidencia, além de estigmatização e preconceito, também indiferença em relação aos preceitos democráticos contemporâneos.
Para entender. Tudo começou quando os novos gestores do MMA, depois de 5 meses de mandato, descobriram o que todo mundo estava careca de saber. Desde 2009, dos aproximados 1,5 bilhão de reais investidos pelo Fundo Amazônia, cerca de 800 milhões são aplicados em projetos executados por organizações da sociedade civil.
Enquanto os países que doaram o dinheiro (Noruega e Alemanha) enxergam a ampla participação dessas entidades como indicador de sucesso do fundo, o MMA, numa clara demonstração de amadorismo e despreparo técnico, não só não tem ideia do que isso significa como resolveu questionar da maneira mais absurda, ou seja, levantando dúvida sobre a lisura e a transparência do organismo.
Para quem não sabe, o Fundo Amazônia é uma iniciativa pioneira e muito bem-sucedida, instituída em 2007 para financiar experiências comprometidas com o que a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas chamou de “Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal”, ou REED.
Depois do encerramento do igualmente bem-sucedido Programa Piloto para Proteção das Florestas Tropicais – custeado pelo G7 (o grupo dos sete países mais ricos do mundo) e, por isso, chamado de PPG7 – o Brasil buscou, por meio do fundo, manter o fluxo de captação das doações internacionais para a Amazônia.
O Fundo Amazônia trouxe dois significativos avanços, sob o aspecto da eficiência na aplicação do dinheiro doado: os recursos são gerenciados pelo BNDES, e não pelo MMA; e os projetos priorizam a introdução de alternativas econômicas, e não ações de fiscalização.
Insinuações no sentido de que os relatórios dos projetos apresentam informações falsas, que não há fiscalização sobre as experiências em execução, ou que o processo de seleção das propostas é viciado depõem contra o BNDES, banco estatal responsável pelo gerenciamento do fundo – em suma, depõem contra o próprio governo.
Especializado na análise de investimentos e maior financiador do desenvolvimento regional brasileiro, o BNDES está conseguindo inverter a lógica do combate ao desmatamento na Amazônia, ao fomentar projetos produtivos voltados para a exploração da biodiversidade florestal, a maior vantagem competitiva da região.
Reconhecida, a gestão do fundo pelo BNDES foi elogiada pelos países doadores – que realizam avaliações de desempenho periódicas, geralmente por ocasião da divulgação das taxas anuais de desmatamento da Amazônia.
Por seu turno, o TCU publicou em 2018 resultado de auditoria operacional onde atesta a eficiência do BNDES no gerenciamento do fundo.
Ninguém tem mais capacidade e legitimidade que o TCU e os próprios países doadores para referendar o Fundo Amazônia – e refutar a sabotagem perpetrada pelo MMA.
  
*Professor Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro florestal, especialista em Manejo Florestal e mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná, e doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.

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