Sistema financeiro e desmatamento na Amazônia: é o
capitalismo, estúpido!
* Ecio Rodrigues
No
início de 2019, a renomada economista Christine Lagarde, atual presidente do
Banco Central Europeu, em discurso para uma plateia seleta, composta por ministros
da economia dos países associados à União Europeia, alertava que o tema das
mudanças climáticas era prioridade para o sistema financeiro mundial.
Enquanto
isso, nesse mesmo momento histórico, os gestores que assumiam o Palácio do
Planalto, em Brasília, deixavam clara sua impressão quanto à importância do
Ministério do Meio Ambiente, MMA. Para o novo governo, esse órgão era desnecessário
e, portanto, deveria ser extinto.
Os novos
dirigentes defendiam, ainda, que o Brasil abandonasse o Acordo de Paris, pois, na
visão deles – muito equivocada, para dizer o mínimo –, o celebrado tratado não
passa de uma conspiração internacional para estagnar a economia dos países.
Nessa
mesma linha de raciocínio enviesado, avaliavam que existe certa histeria em torno
do desmatamento da Amazônia – que deveria ser encarado com naturalidade, já que
o agronegócio precisa se expandir na região.
Passados
18 meses, e diante de sua retumbante estupidez, perdeu fôlego o ímpeto da
equipe governamental em negar a verdade científica da mudança climática e a gravidade
do desmatamento na Amazônia – sem dúvida, dois dos maiores problemas ambientais
em âmbito mundial.
Na
verdade, logo de cara, uma pequena pressão por parte dos próprios produtores
rurais foi o suficiente para jogar por terra a ideia esdrúxula de extinção do
MMA. Sob um argumento singelo e inequívoco: o agronegócio precisa do MMA para lhe
dar suporte e garantir o mercado internacional de soja e carne.
Quanto
ao Acordo de Paris, a subscrição do Brasil permanece. Por conseguinte, continuam valendo as três metas que nos
comprometemos a cumprir até 2030, a saber: aumentar a participação das fontes
geradoras de energia elétrica limpa, como as hidrelétricas, na matriz
energética nacional; restaurar 15 milhões de hectares de florestas degradas nas
margens de rios e topos de morros; e, por óbvio, zerar o desmatamento na
Amazônia.
Nada
obstante, nesse vaivém de declarações e posturas, o MMA saiu, no mínimo,
fragilizado, perdendo espaço político considerável,
já que os temas vinculados à agenda ambiental são caros à ONU e aos países
europeus.
Por
outro lado, erros não faltaram na atuação do órgão.
Provavelmente,
o mais significativo deles foi a sabotagem do Fundo Amazônia, o mais importante
mecanismo de captação de recursos internacionais para o financiamento de
iniciativas de controle do desmatamento e de exploração da biodiversidade
florestal na Amazônia.
Ademais,
ao travar uma batalha – inconcebível, diga-se – contra a atuação de organizações
não governamentais brasileiras reconhecidas no cenário internacional, o MMA
destruiu a própria reputação, carreando, ainda, danosos efeitos colaterais ao
atuante Conama.
Diante
das reações institucionais que chegaram de todos os lados, o MMA se viu isolado,
e perdeu o protagonismo que detinha para o combate ao desmatamento na Amazônia,
que ficou a cargo de um conselho, nos moldes da antiga Pnial (Política Nacional
Integrada para Amazônia Legal) – só que, desta feita, recheado de militares.
A pá
de cal veio agora. Como havia vaticinado Christine Lagarde, um conjunto de
fundos de investimentos chamou a atenção para a relação inversamente
proporcional que se observa entre a motivação para investir no país e as taxas
de desmatamento na Amazônia.
Elevadas
taxas de destruição florestal na Amazônia reduzem os investimentos. Mais simples,
impossível.
Por
último, a nata de economistas que ocupou, nos últimos 30 anos, cargos proeminentes
na condução da economia nacional lançou, nesta última semana, um manifesto.
Denominado
“Uma convergência necessária: por uma economia de baixo carbono”, o documento
não deixa dúvida quanto ao rumo que a economia deve assumir para garantir um
futuro melhor aos brasileiros.
Para
resumir, a meta de zerar o desmatamento na Amazônia foi encampada pelo sistema
financeiro mundial.
É o
capitalismo, estúpido!
*Professor
Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro florestal, especialista
em Manejo Florestal e mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do
Paraná, e doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.
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