Retrospectiva
Sustentabilidade da Amazônia na última década: 2010 a 2019
Para comemorar a nova década que está iniciando em 2020, e como forma de
apresentar uma mostra da realidade vivenciada entre 2010 e 2019 – no que
respeita à sustentabilidade da Amazônia –, foram selecionados e serão novamente
postados, neste blog, artigos considerados representativos, entre os 48
publicados semanalmente, todos os anos, no site da Oscip Andiroba (http://www.andiroba.org.br/).
Dessa forma, um total de 10 artigos, um para cada ano da década passada,
serão republicados, durante 10 semanas, a partir de 05 de janeiro.
Segue o sexto artigo da série, publicado originalmente em 12/04/2015:
Resistência
pública e resiliência dos rios
* Ecio Rodrigues
Como tudo na vida, a alagação e a seca que atingem os rios na
Amazônia têm causa e consequência. Para resolver o problema de maneira
definitiva, sem paliativos, as ações de política pública devem ser direcionadas
no sentido de abolir as causas e tornar as consequências aceitáveis para a
sociedade.
Para além da assistência prestada aos atingidos pelas alagações
e das medidas de racionamento adotadas em função da seca, a atuação da gestão
pública deve se pautar por dois tópicos bem demarcados: resistência pública e
resiliência dos rios.
A resiliência dos rios – vale dizer, a capacidade de reagir às
flutuações extremas de vazão – está no cerne da questão: a ampliação dessa
resiliência é a saída para restabelecer o equilíbrio hidrológico dos cursos
d’água, atacando-se o problema pela raiz.
É preciso ter em conta, porém, que quando se trata do
desequilíbrio hidrológico dos rios e da alteração drástica do regime
pluviométrico – fatores que explicam tanto a seca nas represas do Sudeste
quanto a alagação nos rios do Acre -, é necessário um intervalo de tempo
relativamente elástico para solucionar as causas. Nesse período, a população
terá que conviver com algum tipo de transtorno – e é aí que entram as ações de
resistência pública.
O passo inicial e decisivo para a resistência pública é o
reconhecimento de que eventos extremos, como as alagações e sobretudo as secas,
deixaram de ser sazonais – ou seja, já não obedecem a interstícios de 10 anos
ou mais. Esses eventos, desde os últimos 5 anos, pelo menos, têm incidência
anual, já não podem causar espanto; ninguém pode alegar, tampouco, que foi pego
“desprevenido”.
Com o fim da estação das chuvas e a aproximação da temporada de
seca, que vai de junho setembro, o planejamento das ações de resistência
pública, no caso do rio Acre, deve ser realizado sob a perspectiva de que, da
mesma forma que a alagação foi recorde em 2015, a seca também poderá ser
extrema.
É necessário levar a cabo, portanto, medidas imediatas, com o objetivo
primordial de: promover a desocupação dos terrenos alagadiços; efetuar a
urbanização dessas terras para o fim de convertê-las em áreas verdes; fomentar
a arborização urbana, melhorando os indicadores relacionados ao número de
árvores por habitante.
O planejamento da resistência pública envolve ainda o
monitoramento permanente das condições de pluviosidade, de modo a se obterem
dados cada vez mais precisos. Para tanto, é indispensável o investimento na
aquisição de equipamentos e na contratação de técnicos e especialistas.
Mas o maior desafio da gestão pública está mesmo no embate para
resolver as causas do desequilíbrio hidrológico dos rios, por meio da ampliação
de sua resiliência.
Nesse quesito, a providência primeira diz respeito ao
alargamento do calado, com a retirada e dragagem do material acumulado no leito
ou no fundo do rio. O período de seca é a época ideal para esse tipo de medida
– que, sabe-se lá por que cargas d’água (com o perdão do trocadilho), nunca
chegou a ser efetivada.
A etapa seguinte envolve a restauração florestal da mata ciliar.
A despeito das dificuldades políticas que resultaram nas aleatórias estipulações
do Código Florestal em relação à largura mínima da faixa de mata ciliar, parece
ser consenso no meio científico de que essa “largura legal” perdeu a validade.
Será necessário calcular uma “largura técnica”, isto é, a
largura ideal que a faixa de mata ciliar deverá ter em cada município situado
ao longo da bacia do rio Acre, a fim de ofertar, com maior eficiência, o
serviço de equilíbrio hidrológico do rio. Uma nova negociação política, mais
sóbria, se faz urgente.
Por fim, não se pode esquecer: queimadas nunca mais! É melhor
aproveitar o ensejo para banir de vez essa prática nefasta.
* Professor da Universidade
Federal do Acre (Ufac), engenheiro florestal, especialista em Manejo Florestal
e mestre em Economia e Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná
(UFPR) e doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília
(UnB).
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