Para
comemorar a nova década que está iniciando em 2020, e como forma de apresentar
uma mostra da realidade vivenciada entre 2010 e 2019 – no que respeita à
sustentabilidade da Amazônia –, foram selecionados e serão novamente postados,
neste blog, artigos considerados representativos, entre os 48 publicados
semanalmente, todos os anos, no site da Oscip Andiroba (http://www.andiroba.org.br/).
Dessa
forma, um total de 10 artigos, um para cada ano da década passada, serão
republicados, durante 10 semanas, a partir de 05 de janeiro.
Segue
o quinto artigo da série, publicado originalmente em 09/11/2014:
Economia florestal na Amazônia adiada para 2073
* Ecio Rodrigues
Na
verdade, a manchete que ganhou os noticiários, como se fosse o fato mais normal
e corriqueiro, que dispensasse qualquer tipo de questionamento, foi: “Zona
Franca de Manaus prorrogada até 2073”. Até lá, a maior parte dos parlamentares
que aprovaram a dilatação desse prazo (ou todos) provavelmente já vai ter
morrido. Vão deixar as graves consequências de sua decisão para as próximas
gerações.
Deve
ser difícil encontrar na história recente dos países capitalistas um paralelo –
ou seja, um caso de subvenção estatal concedida por mais de cem anos
(1967/2073), em benefício de alguns setores produtivos.
Por
meio de simples bom senso é fácil concluir que, se uma atividade econômica
requer, para se viabilizar numa determinada região, um prazo tão longo de
subvenção (leia–se isenção de tributos), é porque alguma coisa está errada.
Muito errada.
Mas
os parlamentares, por cegueira ou interesse pessoal, entenderam de forma
diferente e, o pior, a imprensa também. Talvez por isso nenhum partido político
ou autoridade pública, com ou sem mandato, tenha ousado se posicionar
contrariamente à Emenda Constitucional 83/2014, aprovada por unanimidade no dia
05 de agosto.
O que
mais impressiona nesse episódio é que a justificativa quanto à pretensa
relevância econômica da Zona Franca de Manaus foi sendo, aos poucos,
substituída por uma frágil – e insana – alegação relacionada a uma suposta
importância ecológica das empresas ali atuantes. As montadoras de motocicleta,
por exemplo?!
Procurou-se,
a todo custo e por um caminho que fere o intelecto, defender que sem os
benefícios fiscais, concedidos sob um alto custo para a sociedade, as
montadoras de quinquilharias partiriam para outras regiões e, pasme-se!, o
desmatamento aumentaria, causando a destruição da Amazônia.
Ora,
em primeiro lugar, onde o desmatamento entra nessa história?
A
importância da Amazônia, em especial no que se refere ao estoque de florestas e
água, é uma verdade comprovada pela ciência. Da mesma forma, não há dúvida que
o desmatamento da floresta resulta no comprometimento da quantidade e da
qualidade da água produzida. Mas qualquer relação entre essas constatações e a
permanência das montadoras na região foge ao raciocínio lógico.
Ainda
assim, muitos dos defensores da zona franca alardearam o papel crucial da
floresta amazônica na produção de água, no combate à estiagem, e assim por
diante.
Em
segundo lugar, esse argumento só poderia ter alguma validade se – e somente se
– a intenção fosse a de ganhar tempo até a consolidação de alguma alternativa
econômica baseada na biodiversidade. Pois é evidente que as montadoras vão
partir para outra região quando não houver mais subsídios, ou quando os
subsídios já não forem suficientes para tornar sua produção competitiva.
E,
por uma série de razões que não cabem nesse artigo, é um completo absurdo supor
que em 2073, quando as montadoras se forem, as indústrias, as de verdade, irão
correr para Manaus, preferindo essa cidade a São Paulo ou a qualquer outra do
Sudeste.
Está
no aproveitamento econômico da biodiversidade a chave para a manutenção do
ecossistema florestal na Amazônia – o que poderá zerar, de forma definitiva, as
persistentes taxas de desmatamento. Ademais, em termos de geração de emprego e
renda, a exploração da diversidade biológica apresenta potencial bastante
superior à produção de parafernálias.
A
saída econômica e ecológica para a região se assenta num setor florestal forte
e diversificado, como o que se propõe por meio do Centro de Biotecnologia da
Amazônia, o CBA.
Porém,
infelizmente, a urgência em se concretizar uma economia florestal na Amazônia
vai ter que esperar bastante. Conversa para 2073.
*
Professor da Universidade Federal do Acre (Ufac), engenheiro florestal,
especialista em Manejo Florestal e mestre em Economia e Política Florestal pela
Universidade Federal do Paraná (UFPR) e doutor em Desenvolvimento Sustentável
pela Universidade de Brasília (UnB).
Nenhum comentário:
Postar um comentário