segunda-feira, 3 de outubro de 2022

Vote pelo rio Acre

 * Ecio Rodrigues

Nos últimos cinco meses, desde maio de 2022, a quantidade de queimadas no Acre superou a média mensal dos últimos 24 anos sendo que no dia 27, para ser bem exato, ocorreu o recorde para o mês de setembro.

Desde 1998, quando o conceituado Inpe iniciou as medições sobre focos de calor na Amazônia, nunca em setembro se ultrapassou o recorde de 6.506 queimadas.

Para os que não entendem, queimadas são realizadas pelo agronegócio da criação extensiva de boi. 

Estudos recentes demonstram que a incidência de focos de calor na mata ciliar é maior que aquela observada fora da faixa de floresta fixada pelo Código Florestal para proteção dos rios na Amazônia.

Por outro lado, nos últimos 40 anos o desmatamento em toda bacia hidrográfica do rio Acre causou uma taxa de erosão que ultrapassou o ponto da capacidade natural de regeneração.

Em síntese pode-se afirmar, com muita segurança científica, que somente com uma ação decisiva do governo que assumirá em janeiro de 2023 o rio Acre poderá reverter a tendência de degradação que acarreta, com periodicidade anual, secas e alagações extremas.

O fim desse cenário desanimador todo mundo conhece. Exemplos como o do canal da maternidade se repetem na capital e nos oito municípios do interior abastecidos pelo rio Acre.

Explicando melhor, o ponto de não retorno às características hidrológicas de origem acontece, em síntese, assim: a degradação do rio ultrapassa o intolerável; até que não há saída técnica que promova a resiliência e a restauração ecológica do rio; daí as taxas de dejetos domésticos e industriais transformam o rio em canal de esgoto.

Continuando o processo, a população deixa de reconhecer a importância ecológica, econômica e cultural do rio; a concretagem do ex-rio agora canal de esgoto se transforma em demanda eleitoral; e, enfim, a canalização do esgoto e urbanização da margem será a única e nefasta opção.

Por óbvio, a solução para resgatar as características hidrológicas do rio Acre é aumentar sua resiliência.

Entenda-se por resiliência a capacidade natural que os cursos de água possuem de agüentar e se recuperar das agressões, em especial o assoreamento decorrente da erosão que, por sua vez, se origina no desmatamento em toda bacia hidrográfica.

Concluindo, a resiliência do rio está diretamente vinculada ao equilíbrio hidrológico, intensidade de sua vazão, desobstrução do leito e uma série de variáveis, sendo a principal delas o desmatamento nas margens e na área de influencia direta da bacia hidrográfica.

No rio Acre, tanto a retirada da mata ciliar que chega a 70% da faixa prevista no Código Florestal, quanto na área crítica situada entre o leito do rio e a BR 317 em que o desmatamento em algumas cidades supera 80%, o comprometimento da resiliência do rio passou do limite.

Finalmente, discursos e declarações de amor, repetidos para angariar simpatias e votos, estão longe de atender a urgência da política pública que o rio Acre vai demandar em 2023.

Aos eleitores indiferentes à degradação ecológica, restaria ainda apelar para a importância do rio Acre na condição de única fonte de abastecimento urbano de água tratada para a imensa maioria da população acreana.

Hoje, dia dois de outubro, no momento do voto, pense na resiliência do rio Acre.

 

*Engenheiro Florestal (UFRuRJ), mestre em Política Florestal (UFPR) e doutor em Desenvolvimento Sustentável (UnB).

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