segunda-feira, 17 de dezembro de 2012


Castanheira em pasto entra para lista de casos insolúveis
* Ecio Rodrigues
Existe, poucos sabem disso, uma lista de problemas que, no Brasil, preferimos não resolver por simples falta de atitude, bom senso, pragmatismo, objetividade e mais um rol de coisas que faltam e que alguns preferem chamar de falta de vontade política. A castanheira que sucumbe em áreas de pastagem na Amazônia é um desses problemas.
Ainda na década de 1980, no auge da era do desmatamento para ampliação da fronteira agropecuária (mais pecuária que agro), a derrubada da castanheira, uma árvore milenar, costumava deixar a sociedade mais apreensiva que a derrubada da própria floresta.
Acontece que a castanheira, além de seus predicados ecológicos que são muitos e impressionantes, tem um valor econômico e social igualmente impressionante.
A castanha-do-brasil, que tem no Acre um dos seus maiores produtores nacionais (embora o mercado chame o produto de “castanha-do-pará”) não possui concorrente direto. Todos os anos, quem produz castanha comercializa toda a produção por um bom preço. Poucos produtos florestais, nem mesmo a borracha, possui a estabilidade e o valor de mercado da castanha.
Sob o aspecto social, nem se fala. A castanha é um produto típico da pequena produção e, melhor ainda, duma pequena produção que se encontra dispersa no interior da floresta e que tem na castanha um dos motivos para permanecer ali, reduzindo as graves estatísticas de êxodo rural.
Estudos no campo da socioeconomia, realizados junto a populações florestais do Acre, dão conta que mais de 40% da renda dessas famílias provêm da coleta e da venda da castanha.
Todavia, essa argumentação, que é válida para a castanheira que se encontra em franca produção dentro da floresta, perde todo o significado quando a árvore se encontra isolada numa área de pasto porque não pode ser, pela normatização vigente, derrubada.
De que adianta a legislação não permitir a derrubada da árvore, se essa árvore vai morrer em pé – uma vez que a espécie não resiste ao isolamento no pasto e, obviamente, à nefasta prática da queimada?
Esse é um lado do entrevero. Se a norma tinha como alvo proteger a árvore, diante do desmatamento e da queima realizados para a instalação da pecuária, esse objetivo não é atingido, pois a árvore morre de qualquer jeito. E mesmo que a castanheira consiga resistir, o que acontece vez ou outra, sua função ecológica, econômica e social não resiste.
Em termos ecológicos, a espécie deixa de fazer parte de um ecossistema no qual mantém relações com a fauna e com outras espécies vegetais, já que a árvore fica isolada no meio do pasto, onde só há capim e boi, duas espécies que, definitivamente, não fazem parte do nicho ecológico da castanheira.
Deixa de ter relevância social, pois a castanheira no pasto, em 90% dos casos, pertence a um latifundiário que não tem qualquer relação com a pequena produção, muito menos extrativista.
Perde o significado econômico por duas razões. Primeiro, porque sua produção no pasto se torna descendente, ano após ano, até não ser mais produzido ouriço algum. E segundo, mais importante, o pecuarista não quer saber disso, ele é produtor de gado e não de castanha; ao contrário, ele demoniza essa espécie que só atrapalha a sua vida.
Para completar, a espécie possui um valor inestimável como produto madeira. Estima-se que mais de 40.000 casas poderiam ser construídas com a madeira das castanheiras que definham nos pastos.
Enquanto a vontade política se perde no interminável calendário eleitoral, a castanheira continua morrendo no pasto.
     
 * Professor da Universidade Federal do Acre (Ufac), Engenheiro Florestal, Especialista em Manejo Florestal e Mestre em Economia e Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) e Doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília (UnB).

2 comentários:

  1. Meu caro Ecio, que tal comentar tbem qto ao manejo da coleta dos frutos na qual existe a falta de indivíduos jovens,devido ao excesso coletado. Forte abraço meu caro.Irau.

    ResponderExcluir
  2. Será o tema de um próximo artigo e obrigado pela contribuição!

    ResponderExcluir

Livro Ciliar Só Rio Acre

Livro Ciliar Só Rio Acre